Agronegócios
30/05/2022 13:03

Exclusivo/Robeco/Peter Van der Werf: investimentos focam sustentabilidade, sobretudo no setor pecuário


Por Tânia Rabello

São Paulo, 26/05/2022 - Com US$ 214 bilhões em ativos para investir no mundo, incluindo o Brasil, "mercado ascendente e muito importante", o fundo holandês Robeco tem a sustentabilidade como foco central. Um dos objetivos do grupo é alcançar a marca "net zero" em todos os seus negócios até 2050 - ou seja, neutro em emissões de gases do efeito estufa. Não é um desafio pequeno, já que, entre os alvos dos investidores, estão companhias do setor de proteína animal listadas em bolsa, um setor sempre fiscalizado quanto ao seu comportamento ambiental, conta o gerente sênior de engajamento do Robeco, Peter van der Werf, em entrevista exclusiva ao Broadcast Agro. No Brasil, papéis de JBS, Marfrig, Minerva e BRF estão sempre no radar do Robeco para aportes que, por aqui, alcançam entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões. "Investimos também em empresas de papel e celulose, em fintechs e em gestão de bens", detalha ele.

Para orientar a aplicação de tamanho volume de recursos e permitir ao Robeco saber se o setor de proteína animal atende a práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês), o fundo conta com o Fairr Index, da Fairr Initiative - associação que reúne investidores globais com US$ 45 trilhões em carteira. O ranking realiza detalhada pesquisa, diretamente com as 50 maiores empresas globais de proteína animal, e divulga os resultados anualmente, que funcionam como um orientador para os fundos de investimento associados à Fairr.

Para o Robeco, o Fairr Index é essencial, já que a estratégia prioritária da empresa é investir em empreendimentos sustentáveis. "Nosso foco principal leva em consideração os fatores ESG", reforça Van der Weirf. "Tanto que temos uma equipe de 50 especialistas dedicados a pesquisas ligadas à sustentabilidade, a fim de definir a estratégia de 'clima' - ou seja, direcionar o máximo possível os aportes em projetos sustentáveis a longo prazo", prossegue. "Isso comprova o quão importante para nós é este tema."

No caso de companhias agropecuárias brasileiras, além de se fazer uma avaliação financeira e do potencial de retorno aos acionistas, o fundo analisa, por exemplo, a sua "exposição ao risco de desmatamento", diz Van der Werf. "Empresas de soja e proteína animal têm uma exposição potencial ao desmatamento, mas também contam com a implementação de políticas contra a derrubada de florestas", explica. "Assim, nosso foco, na abordagem dessas companhias, é a efetividade na adoção dessas políticas."

Para tanto, o time de especialistas em investimentos sustentáveis do Robeco traça um "perfil dedicado da empresa, olhando para a maioria dos fatores ligados à sustentabilidade e que poderiam interferir no risco, no lucro ou no seu crescimento", explica o executivo. "Esta é a lente pela qual nossa equipe olha os fatores de sustentabilidade das empresas."

Outra linha de ação da equipe consiste em acompanhar os números de desmatamento no País - e não só na Amazônia, mas também no Cerrado, tão importante quanto em biodiversidade, e travar conversas com o governo brasileiro no sentido de alertar para os riscos da derrubada de florestas. "Trabalhamos com políticas de investimento sustentável, por meio das quais entramos em contato diretamente com o governo brasileiro a respeito da performance atingida no desmatamento", diz o gestor. "Vemos que, desde 2020, o desmatamento está acelerado e indo na direção errada; esperamos, definitivamente, ver uma melhora nesta questão por parte do governo brasileiro."

Quanto às companhias de proteína animal, Van der Werf reconhece que "houve um avanço" em relação às questões ESG e desmatamento, e também no que diz respeito ao monitoramento de fornecedores diretos e indiretos de gado aos frigoríficos. No Índice Fairr de 2021, divulgado em dezembro, JBS, Marfrig, Minerva e BRF subiram no ranking e Marfrig passou a ser considerada como companhia de baixo risco para os investidores para questões ambientais. "É uma melhora, mas ainda lenta; esperamos que, até 2025, as empresas tenham controle total da cadeia e total transparência quanto a seus números", destaca. "Permanecemos preocupados, porque ainda temos três anos em que o desmatamento pode ocorrer fora do nosso controle", diz. Por isso, o Robeco - via Fairr Initiative - continua a cobrar as empresas de proteína animal brasileiras. "Queremos dados transparentes e também avisamos o governo sobre nossa preocupação com a indústria de carne, especificamente, mas também sobre a reputação global do País, dada a importância dos ecossistemas brasileiros para o mundo para se manter a estabilidade climática."

Para Van der Werf, a comunicação com empresas é mais facilitada do que na esfera oficial, embora o executivo reconheça que "diferentes partes do governo" estejam abertas à discussão sobre as preocupações ambientais do fundo. "O que é sempre desafiador, nessas relações, é encontrar um ponto no qual a sua demanda influencie a contraparte", diz o gestor do Robeco. "Com o setor corporativo é mais fácil, já que as companhias têm áreas e executivos específicos para ESG", justifica. "Mas na esfera governamental é tudo muito pulverizado, são vários stakeholders, vários ministérios, além do Senado, da Câmara... Há muitas partes interessadas como interlocutores e temos, por isso, de repetir a mesma mensagem para todos."

Van der Werf reforça, neste contexto, que o "preocupante é que a taxa de desmatamento ainda está subindo", diz. "É por isso que ainda estamos lutando, para termos mais encontros, forçando a barra com o governo para passar nossa mensagem."

O fato de as companhias de proteína animal no Brasil, principalmente as de carne bovina, terem apresentado excelente desempenho financeiro no primeiro trimestre de 2022 e no ano passado, conforme mostram seus balanços, também é levado em consideração pelo Robeco. "Mas, obviamente, apesar dos bons resultados, que constantemente monitoramos, a sustentabilidade continua com peso fundamental", diz Van der Werf. "Para companhias que têm um risco ambiental alto, damos, conforme nossos critérios, descontos no preço da ação que a empresa possa atingir, pois, com este desconto, o risco diminui para os acionistas", diz. "É assim que equilibramos os riscos de sustentabilidade, adicionando ou subtraindo valor caso a caso."

O atual cenário de instabilidade provocado pela guerra na Ucrânia, com combustíveis fósseis como gás natural e petróleo protagonizando as discussões globais, não tira o foco em sustentabilidade do Robeco. "A volatilidade atual, de fato, afeta várias estratégias nossas", reconhece Van der Werf. "Mas, ao mesmo tempo, meu trabalho e dos meus colegas é traçar estratégias que entreguem valor agora, e também em 2025, 2030, e até em 2050, quando o Robeco pretende se tornar 'net zero' em investimentos", diz o executivo. "Sob esta perspectiva, de carbono zero daqui a três décadas, preferimos olhar para o longo prazo, buscando atravessar, agora, essas 'águas rochosas'", explica. "Somos investidores de longo prazo e nossos clientes também têm esta visão."

Desta forma, Van der Lerf avalia que fatores como desmatamento, leis de biodiversidade e direitos humanos entram na agenda de longo prazo. "Acho que este é o desafio que encontramos como gestores de bens; é preciso gerenciar riscos e cenários de longo prazo e integrar isso nas decisões de investimento que também entregam resultados de curto prazo. Este é o nosso maior desafio."

Contato: tania.rabello@estadao.com
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