Economia & Mercados
26/04/2022 15:20

Especial: No cara e coroa do crédito, Santander vê inadimplência subir e desagrada ao mercado


Por Matheus Piovesana

São Paulo, 26/04/2022 - A boa atividade comercial e a valorização do real no primeiro trimestre deste ano devolveram ao Santander Brasil o posto de maior gerador de lucros para o banco no mundo, mas do outro lado da moeda, a qualidade do crédito piorou. Com os brasileiros mais endividados e a inflação corroendo a renda, o banco viu a inadimplência subir, o que ofuscou as margens e fazia, há pouco, com que as ações caíssem cerca de 5% na B3.

No primeiro balanço da gestão do CEO Mario Leão, o banco teve lucro líquido gerencial (que desconsidera o ágio de aquisições) de R$ 4,005 bilhões, alta de 1,3% em relação ao mesmo período do ano passado. O aumento das margens com clientes e das receitas com serviços sustentou o crescimento, mas os efeitos do cenário macroeconômico mais desafiador cobraram seu preço.

Em um ano, a inadimplência, medida por atrasos superiores a 90 dias, passou de 2,1% para 2,9%, e no caso da carteira de pessoas físicas, superou índices de março de 2019, anteriores à pandemia da covid-19. Diante da carteira com maior risco e da perspectiva de alta da inadimplência, o banco gastou 46% a mais com provisões nos três primeiros meses deste ano, ao separar R$ 4,612 bilhões para seu colchão contra perdas.

"Não vemos a inadimplência piorando continuamente, mas ainda não começou a melhorar", disse Leão durante a coletiva de resultados, sua primeira como CEO. Ele assumiu o posto em janeiro, substituindo Sergio Rial, que passou a presidente do conselho. E chegou ao cargo em um momento de teste para os modelos de crédito do setor.

A alta da inflação, mais perceptível a partir do segundo semestre do ano passado, e a elevação da taxa Selic desenharam um cenário mais arriscado para o crédito. O Santander detectou a tendência e, por isso, colocou o pé no freio. Ou seja: para evitar uma piora mais rápida, cresceu menos.

"Uma combinação de alta inflação, alta dos juros e maior endividamento das famílias provocou uma desaceleração no crescimento do crédito", disse o CFO do banco, Angel Santodomingo, durante teleconferência com analistas.

A combinação de fatores foi mal recebida por analistas. "As despesas com provisões subiram 25% em um trimestre, e muito acima das nossas estimativas", escreveram Pedro Leduc, Mateus Raffaelli e William Barranjard, do Itaú BBA. Eles destacaram que a inadimplência entre 15 e 90 dias subiu mais rápido que o indicador acima de 90 dias. "Isso aponta para uma deterioração da qualidade de ativos mais rápida à frente."

Para Eduardo Rosman, Ricardo Buchpiguel e Thiago Paura, do BTG Pactual, o papel das renegociações de dívidas no controle da inadimplência é um ponto que exige atenção, e com desempenho acima dos pares, a ação do Santander tem espaço para correção. "Permanecemos positivos em papéis dos bancos brasileiros, mas o Santander seria nosso 'caixa' para o setor."

O custo de crédito do Santander no Brasil, de 3,94%, foi o maior do Grupo em todo o mundo. Mas, no outro lado da moeda, a filial brasileira voltou a ser a de maior lucro do conglomerado, ultrapassando o Santander americano, beneficiado pela valorização do dólar em 2021. No primeiro trimestre, o Brasil também foi campeão de receitas, com montante maior que o de todas as operações da América do Norte somadas.

Margens

No cara e coroa do risco, a opção por empréstimos mais arriscados e também mais rentáveis fez a margem do Santander com clientes crescer cerca de 30% em um ano, para R$ 13,854 bilhões. Santodomingo afirmou que a maior fidelização também contribuiu para o salto, bem como o aumento da base, que chegou a 54,8 milhões de clientes.

"Na ponta inversa, o banco teve um bom crescimento na margem com clientes (+13% em um trimestre e de +30% em um ano), dado que o mix melhor e bons resultados no financiamento levaram a spreads (diferença entre custo e captação e juros cobrados nos empréstimos) maiores", comentaram Tito Labarta, Tiago Binsfeld, Beatriz Abreu e Nicholas Walker, do Goldman Sachs.

O bom desempenho com os clientes compensou a forte queda no resultado da tesouraria do banco, que caiu 97% no comparativo anual, para R$ 84 milhões. A Selic foi a vilã do resultado, não só por ter subido, mas por ter subido muito rápido.

"Se a alta da Selic fosse de um ponto porcentual por trimestre, o impacto na tesouraria seria muito menor, porque a alta tem sido de um ponto por Copom", afirmou Leão aos jornalistas. Ele destacou, por outro lado, que a tesouraria do Santander mudou de foco nos últimos anos: deixou de atuar no viés proprietário para trabalhar com recursos dos clientes de todos os portes.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com
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