Economia & Mercados
10/01/2022 08:53

Alta de juros nos EUA atiça brasileiro por ativo conservador, mas 'FANG' pode ser opção


Por Bruna Camargo*

São Paulo, 06/01/2022 - A alta de juros nos Estados Unidos já em março ainda não foi confirmada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano), mas é amplamente aguardada pelo mercado. Enquanto o mundo inteiro está prendendo a respiração para acompanhar os próximos passos da política monetária do país, especialistas ouvidos pelo Broadcast avaliam que os investidores brasileiros devem acabar reagindo com reforço de posições defensivas na carteira. Afinal, trata-se de mais um tópico na pilha de preocupações com as quais o Brasil tem de lidar em 2022.

Na tarde de ontem, o mercado absorveu as informações contidas na ata da reunião de política monetária do Fed em dezembro. O documento indicou que uma alta de juros mais cedo e mais rápida do que o esperado anteriormente pode ser necessária, levando em conta especialmente os panoramas para a economia americana, mas os dirigentes ainda não entraram em consenso sobre a data para isso acontecer.

“Eles já aprenderam a lição de não afirmar nada que não tenham certeza - como fizeram com a palavra ‘transitória’ para a inflação. Não vão comprar nenhuma briga agora se podem esperar, e teremos três payrolls [relatório de emprego americano] para acompanhar até a próxima decisão”, observa Álvaro Frasson, economista do BTG Pactual digital. Os dados do payroll de dezembro serão divulgados amanhã e a expectativa é positiva, após pesquisa da ADP apresentar números bem acima do esperado ontem.

Assim como foi no período que antecedeu o anúncio da retirada de estímulos, o chamado "tapering", os especialistas avaliam que a elevação dos juros está bem sinalizada e já precificada - o mercado vê os Fed funds chegando a mais ou menos 1,5% em dois anos. Embora o cenário indique a redução de liquidez no mundo, uma fuga de capital estrutural para os Estados Unidos em detrimento dos países emergentes não deve acontecer, avalia Mario Schalch, gestor de multimercado da Neo Investimentos. "A diferença na taxa de juros real do Brasil em relação aos Estados Unidos está na casa dos 6%. A deles ainda será baixa. Têm menos risco, mas não é uma decisão simples para o investidor", diz Schalch.

No entanto, isso não quer dizer que o brasileiro não vai sentir o baque. "No passado tivemos câmbio subindo, juros subindo e Bolsa caindo. Não dá para dizer que vai ser diferente, o cenário base é esse. Mas se o aperto for mais forte ou mais rápido que o precificado, os ativos brasileiros sofrerão, ainda mais com o processo eleitoral se aproximando, com muito ruído e turbulência. É um problema a mais para a gente enfrentar", afirma Thomaz Callado, gestor da Parcitas Investimentos.

Como fica a carteira

A ideia geral é que o investidor brasileiro vai buscar uma carteira defensiva para surfar a volatilidade de 2022 - em uma semana do novo ano, já deu para sentir a persistência de temores fiscais, políticos e econômicos. Como disseram os especialistas ouvidos pelo Broadcast, a alta de juros americana acaba sendo mais um problema na fila. A boa notícia é que sempre há para onde correr.

No Brasil, o foco é nos ativos mais conservadores. Frasson, do BTG Pactual digital, diz que a captura de bons rendimentos com o risco-retorno “mais tranquilo” deve se dar na renda fixa, especialmente nos produtos pós-fixados a pelo menos 100% do CDI.

FANGs?

Nos Estados Unidos, pode ser interessante observar as FANGs, como são conhecidas as gigantes americanas da tecnologia. Como as ações são negociadas com múltiplos muito elevados, são as que mais sofrem quando as taxas de juros sobem. “Neste caso em particular, a gente tem uma leitura construtiva. As FANGs crescem tanto e com uma margem tão robusta que o fato de o custo de financiamento da economia americana sair de 1,5% para 2%, na taxa longa, não deveria mudar tanto a performance delas. É claro que num primeiro momento o mercado estressa e o Nasdaq cai, como já estava caindo, mas são empresas monopolistas, não são alavancadas, têm uma situação de caixa confortável e crescem 30% ao ano. A gente tende a achar que é uma oportunidade de compra”, destaca Callado, da Parcitas Investimentos. Mas isso é realmente em relação às gigantes; no caso das empresas de tecnologia menores, é preciso ter mais cautela, pontua Frasson. Para ele, quem quer alocar em Bolsa americana pode ver melhor desempenho nas empresas da economia real.

E com o que mais ter cuidado? Alberto Amparo, analista de investimentos da Suno Research, destaca justamente as empresas de crescimento. "Se você está comprando uma empresa que não gera muita receita hoje mas tem a expectativa de geração de caixa no futuro, atenção. O valor presente delas cai drasticamente por causa dos juros mais altos, e essas companhias poderiam ter correções fortes nos valuations. Tesla ou Nvidia, que geram pouco caixa e têm valor de mercado alto por causa das expectativas, são dois exemplos", afirma. Mas ele faz uma observação: "Você não vai posicionar seu portfólio por achar que os juros vão subir ou cair. Você quer posicionar em ativos que acredita que estão baratos."

Vai ter que se explicar

As apostas sobre a política monetária americana monitoradas pelo CME Group apontam cada dia mais para uma alta de juros em março. Nos dados divulgados ontem, depois da ata do Fed, elas mostravam 67,5% de chance de uma alta de 25 pontos-base em março e 3,9% de um avanço de 50 pontos-base; apenas 28,6% eram pela manutenção na faixa atual. A Capital Economics destacou em relatório que a elevada e persistente inflação nos Estados Unidos justifica a condução mais dura pelo Fed - talvez só a partir de junho, mas com risco crescente desse movimento antecipado.

No entanto, a avaliação do Citi é de que, caso não suba as taxas em março, o Fed precisará se explicar. Isso porque em um cenário de mercados dinâmicos e forte demanda sustentada - apesar do aumento nos casos de covid-19 -, uma alta no terceiro mês do ano deve acalmar as preocupações de um aperto muito rápido das condições financeiras, segundo análise do banco.

Contato: bruna.camargo@estadao.com

*Com colaboração de Camila Vech (especial para o Broadcast), Francine De Lorenzo, Gabriel Bueno da Costa, Gabriel Caldeira, Ilana Cardial, Letícia Simionato e Matheus Andrade
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