Economia & Mercados
28/09/2022 16:56

Especial: Hidrologia e carga seguram preços da energia no 4tri22 e em 2023


Por Luciana Collet

São Paulo, 27/09/2022 - Em um cenário totalmente diverso do vivido no ano passado, o setor elétrico brasileiro observa a chegada do período úmido com uma sensação de "conforto", dado o atual nível dos reservatórios das hidrelétricas e a perspectiva de chuvas "dentro da normalidade" para os próximos meses. Com isso, a expectativa de agentes do mercado consultados pelo Broadcast Energia é de preços de energia baixos no quarto trimestre de 2022 e no ano que vem, com possibilidade até mesmo de valor nulo do preço spot em alguns meses de 2023.

"Não tem outra perspectiva se não preço baixo", resume o sócio diretor da Ecom Energia Márcio Sant'Anna. "Em 20 anos, nunca vi um cenário tão favorável do ponto de vista hidrológico", diz. Segundo ele, pouco mais de um mês atrás ainda havia o temor no mercado de que um bloqueio meteorológico pudesse impulsionar o valor do megawatt-hora (MWh). No entanto, com as frentes frias observadas nas últimas semanas, associadas à ocorrência de chuvas, dificilmente o preço spot - tecnicamente conhecido como Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) - sairá do piso regulatório ou de valor próximo disso até o fim do ano e nos primeiros meses de 2023.

A Ampere Consultoria estima que o PLD deve se manter no valor mínimo de R$ 55,70 por MWh no quarto trimestre de 2022. O quadro é bastante diverso do verificado há um ano, quando o PLD era 10 vezes maior e estava próximo dos R$ 600/MWh.

Para o ano que vem, a estimativa da consultoria também é de preços inferiores a R$ 100/MWh na média anual, podendo ficar abaixo do piso regulatório de R$ 55,70/MWh em alguns meses. "No segundo trimestre, principalmente, sabemos que tem um afundamento dos preços, por conta da questão do Norte... Então, dá pra imaginar esse preço próximo de Nulo, considerando um mercado sem limite inferior", diz o diretor da consultoria André de Oliveira.

Ele se refere ao fato de que no início de setembro o juiz federal João Carlos Mayer Soares, da 17ª Vara Federal Cível da seção judiciária do Distrito Federal, deferiu parcialmente o pedido de urgência de ação civil pública apresentada pela a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e Consumidores Livres (Abrace) e reconheceu a ilegalidade da criação de patamares mínimos e máximos de PLD por meio de decreto, tendo em vista a ausência de previsão legal anterior nesse sentido. Com isso, concedeu o prazo de 90 dias para que uma nova norma seja editada.

Considerando que seja mantida a extinção do piso regulatório do PLD, Oliveira explica que o preço poderia ser zerado especialmente entre abril e maio, quando ocorre o período de chuvas mais intensas no Norte e, consequentemente, há excedente de geração hidrelétrica em importantes usinas da região, como Belo Monte, Jirau e Santo Antonio. "Se os reservatórios fecharem o ano em condição confortável, que é o que tudo está indicando, em abril e maio a chance de preço nulo é grande até esse excedente hidráulico do Norte deixar de existir, quando o regime hidrológico for em direção ao período seco", disse.

Procuradas, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) não se pronunciaram a respeito dos desdobramentos da decisão judicial. A CCEE informou apenas que recebeu a notificação e está analisando o caso. A Aneel confirmou que vai entrar como litisconsorte passivo.

Agentes de mercado trabalham na expectativa de novos desdobramentos sobre o tema, que possam levar a alguma manutenção de um piso regulatório para o ano que vem. Com isso, apontam a tendência de manutenção de preços de energia próximo do mínimo definido pela Aneel durante os primeiros meses de 2023.

Hidrologia

"Estamos chegando com condições, do ponto de vista de água armazenada, muito boas", diz o diretor de Planejamento e Controle da EDP, Dyogenes Rosi.

O diretor de Comercialização da (re)energisa, Leandro Issao Tsunechiro, reforça que "temos um cenário muito positivo do ponto de vista do armazenamento dos reservatórios em 2022, o melhor nível desde 2011".

Eles se referem ao fato de que ontem (26), os reservatórios do Norte estavam em 76,83% da capacidade, melhor numero em mais de 10 anos. No Sudeste/Centro-Oeste, considerada a caixa d'água do País, a Energia Armazenada estava em 51,16%, também no maior índice pelo menos desde 2012. O Sul anotava 83,51%, patamar mais elevado para a data desde 2016, e o Nordeste registrava 66,83%, ligeiramente abaixo do anotado no mesmo dia de 2020.

O diretor de Trading, Gestoras e Atacado da 2W Energia, Artur Teixeira, salienta que essas taxas de reservatórios foram propiciadas pela maior geração eólica e solar no Nordeste. "Foi segundo ou terceiro ano com impacto muito forte das eólicas; o Nordeste segurou a queda de reservatório no Sudeste, houve muita geração eólica e solar neste ano, o que só deve aumentar nos próximos anos", diz.

Os profissionais avaliam que os mapas climatológicos atualmente apontam que o período úmido tende a acontecer dentro da normalidade, sinalizando, portanto, tranquilidade para a operação do sistema e preços baixos no mercado de energia até o fim do ano e para 2023.

Carga

O diretor da EDP acrescenta que também a perspectiva para a carga, outra variável importante na formação do preço, vem apresentando comportamento favorável à manutenção de preços baixos. "Hoje a carga não vem crescendo de forma consistente, ainda mais que o período tem sido muito frio atualmente, em relação a outros anos, o que faz com que a carga fique um pouco menor".

O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) prevê atualmente uma queda de 4,2% na carga de Energia do Sistema Interligado Nacional (SIN) em setembro, decréscimo maior que o 1,2% inicialmente previsto. Além do clima mais ameno que o esperado, contribui para a revisão para baixo o fato de que as autoridades setoriais divulgaram em agosto projeções consideradas pelo mercado como superestimadas e que vão sendo aos poucos corrigidas.

Quando atualizou as Previsões de Carga para o Planejamento Anual da Operação Energética 2022-2026, as autoridades indicaram que esperavam uma carga mais elevada tendo em vista os estímulos com a concessão temporária de auxílio diferentes grupos sociais, com destaque para o reflexo no setor de serviços. No entanto, na prática, o impulso dado no consumo de energia a partir desse setor é menos impactante.

Tsunechiro, da (re)energisa, diz esperar que até o final do ano as próximas revisões serão direcionadas para baixo, caso não ocorra algum acontecimento climático atípico de grande elevação de temperatura. "Podemos considerar ainda o impacto da geração distribuída nos últimos meses, principalmente, que deve interferir no desempenho da carga. Essa situação corrobora para manutenção de preços baixos", diz.

Preços de mercado

Considerando as principais variáveis da formação de preço, os profissionais consultados indicam que os preços de mercado para os contratos de fornecimento de energia em 2023 atualmente oscilam acima dos R$ 120 por MWh, na média.

O valor é considerado baixo para os padrões do mercado e é verificado a despeito das mudanças previstas nos modelos de formação de preço a partir de 2023, quando serão incorporados novos parâmetros de aversão a risco, o que teria potencial para impulsionar o valor do MWh.

Contato: energia@estadao.com
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