Economia & Mercados
08/09/2021 09:06

Especial: Repelidas na crise, micro, pequenas e médias empresas agora são cortejadas por bancos


Por Marcelo Mota

São Paulo, 06/09/2021 - Relegados a segundo plano por toda a vida, mas especialmente no ano passado, quando as torneiras do crédito com recursos livres praticamente se fecharam para elas, as micro, pequenas e médias empresas estão agora no centro da disputa do setor financeiro. Após mostrarem que, na grande maioria dos casos, não deixam de honrar suas dívidas mesmo quando a receita míngua, ganharam a atenção dos bancos. Motivo: tomam recursos a juros inimagináveis entre as grandes companhias.

Nessa arena, os três grandes bancos privados do País se movimentam para defender do ataque dos digitais, fintechs e até fundos de crédito (FIDCs) a preponderância histórica que, junto aos dois públicos, têm sobre as PMEs. Dentro deles, entretanto, a sigla indica um segmento que muitas vezes abarca um grupo mais diverso do que sugerem as três letras.

São quase 20 milhões de CNPJs, de Microempreendedores Individuais (MEIs), com faturamento anual de até R$ 81 mil, até Médias, que faturam até R$ 300 milhões ao ano. Isso significa que o espaço para crescimento nesse ramo é grande. Cada um dos três maiores bancos privados brasileiros afirma ter ao redor de 1,2 milhão de empresas desse porte concentrando negócios consigo.

Conforme levantamento realizado pelo marketplace de crédito Capital Empreendedor a partir resultados reportados pelos três maiores bancos privados no segundo trimestre, o crédito concedido a micro, pequenas e médias totalizava quase R$ 340 bilhões. Com isso, respondiam por 43,1% dos empréstimos feitos por todo o sistema financeiro ao segmento, de R$ 788,2 bilhões, incluídos na conta recursos livres e direcionados.

Dentre os três bancos, o Bradesco detinha a maior carteira total de crédito concedido às PMEs, com R$ 147,8 bilhões, no fim de junho. O Itaú vem em seguida, com R$ 133 bilhões e, entre os privados, o Santander aparece na terceira posição, com R$ 58,9 bilhões em financiamentos ao segmento.

A competição mais acirrada se concentra na camada mais baixa desse grupo, na qual os spreads são maiores e o apetite por crédito está longe de ser saciado, com níveis de calote muito bem comportados. Em maio, conforme dados disponibilizados pelo Banco Central, a taxa de inadimplência entre as microempresas era de 3,46% e, entre as pequenas, de 3,11%.

Mas, nesse espectro de clientes, as carências vão muito além do que pode ser suprido por capital ou serviços puramente financeiros. "No fim, a gente está falando de um CPF", diz Renato Mansur, diretor de Canais Digitais do Itaú Unibanco. "Temos buscado uma simplificação no processo, salvar tempo do empreendedor para ele cuidar do 'business' dele."

Em outras palavras, os bancões já entenderam que não basta fornecer o combustível: é preciso dar suporte ao cliente e ajudá-lo em sua dura jornada, até que cresçam e passem a consumir mais produtos rentáveis.

"A gente está trabalhando nas jornadas além das bancárias", diz o diretor de estratégias para PMEs do Itaú Unibanco, Carlos Eduardo Peyser. Segundo ele, o banco tentar ajudar o empreendedor a vencer suas dificuldades em campos como "gestão do negócio, conciliação de contas, gestão de folha de pagamento, de contas a pagar e receber".

No principal concorrente privado não é diferente. "A gente começou também a oferecer produtos não financeiros para esse cliente", diz Nilton Pereira dos Santos Jr., diretor do Bradesco Empresas. O Bradesco aprimorou sua esteira digital para se equiparar aos novos concorrentes, mas também joga com a extensão de sua rede para que o cliente seja atendido como preferir.

"O negócio de pequenas empresas deu um tremendo salto", diz o superintendente executivo para Produtos do Santander, Alexandre Fontenelle. Como nos outros dois, a batuta que rege essa evolução no Santander é o mais elementar dos serviços bancários.

Casamento

"A coisa que mais engaja cliente é crédito", diz Peyser. Mas alguns geram mais engajamento que outros. "Tem determinados pontos de contato com o cliente que são super importantes em relação a engajamento. "Fazer operações de longo prazo, como financiar a compra de uma máquina, não é o sonhos do ponto de vista de rentabilidade, mas é de engajamento."

O Bradesco também já entendeu que, para selar esse relacionamento de maneira mais duradoura, é preciso ir além da antecipação de recebíveis. Com recursos próprios, chega a conceder empréstimos com prazos de até sete anos, para investimento. Segundo Santos, desde o início da pandemia a carteira PME do Bradesco vem se expandindo a uma taxa anualizada de 36%.

"A gente dá crédito para empresas recém fundadas", afirma ele. Em muitos casos, o Bradesco está fideliza um cliente que já tinha na física. "Há um movimento maior de pessoas se tornando empreendedoras. A crise acelera isso."

Em alguns casos, afirma Santos, é preciso ajudar o cliente a sair da informalidade. "Esse empreendedor mistura os bolsos. A gente quer que ele se formalize, que ele abra seu cartão CNPJ." Esse mesmo perfil que embaralha os canais, porém, embute um comportamento benigno, que contribui para o controle da inadimplência. "O maior ativo do empreendedor é o nome dele", diz. "Ele preserva muito isso."

Fontenelle diz que a digitalização tornou mais fácil separar os bolsos do pequeno empreendedor. "Isso tudo agora é simples, online, na palma da mão", afirma. "Desde constituir a empresa até abrir conta no banco." As linhas de capital de giro, segundo ele, já trafegam mais pelo canal digital, não tanto nas agências.

Mas é preciso paciência para explorar o filão. "A gente dá para o empreendedor 10 boletos de graça por mês. Para começar o negócio dele, não está me pagando nada, mas é óbvio que vai prosperar, crescer e a gente vai ter relacionamento de longo prazo", diz Santos. "Certamente, ele vai demorar para rentabilizar."

Contato: marcelo.fernandes@estadao.com
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