Economia & Mercados
27/05/2022 17:28

Especial: Eletronuclear pode afetar preço da Eletrobras na reta final da capitalização


Por Luciana Collet

São Paulo, 26/05/2022 - A solução adotada para a Eletronuclear na privatização da Eletrobras ameaça afetar a precificação das ações da estatal elétrica na capitalização que está para ocorrer. Segundo fontes ouvidas pelo Broadcast, o modelo de reestruturação definido para a empresa de geração de energia nuclear hoje controlada pela Eletrobras causou desconforto em potenciais investidores, que podem considerar que o negócio não gera valor para a companhia - ou até mesmo que tira valor.

A Eletronuclear foi constituída com a finalidade de produzir energia elétrica por meio de usinas nucleares, uma atividade que, pela Constituição Federal, é de competência exclusiva da União. Portanto, para a privatização da Eletrobras, foi necessário encontrar uma solução que mantivesse a empresa sob controle governamental. Ficou definido que a Eletronuclear será adquirida pela recém-criada Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBPar).

Para isso, a Eletronuclear irá emitir novas ações ordinárias e preferenciais, de acordo com o valor justo calculado em laudo de avaliação independente. Todas as preferenciais e parte das ordinárias serão subscritas pela Eletrobras pelo valor total de R$ 6,232 bilhões. Outro bloco de ações ordinárias serão cedidas pela Eletrobras à ENBPar, a título gratuito e pelo montante de R$ 3,5 bilhões. Ao final da transação, a Eletrobras terá sua participação na Eletronuclear diluída e terá menos de 50% das ações ON. A ENBPar vai passar a deter o controle de Eletronuclear.

"Na prática, a Eletrobras fica com dois terços da Eletronuclear, permanece com exposição econômica, sem ter poder de gestão do ativo", disse um advogado que acompanha de perto a operação e pediu para não ser identificado. Ele citou ainda a possibilidade de um "estouro no orçamento" (cost overrun) que a companhia poderia ter, relacionado, em especial, à conclusão das obras da usina de Angra 3. "Isso está tirando valor do negócio (capitalização da Eletrobras)", afirmou.

Já a advogada especialista em infraestrutura e energia Ana Karina Souza, sócia do Machado Meyer Advogados, considera que a Eletronuclear "pode ser vista como elemento de risco", tendo em vista que a empresa atua em um nicho específico, de monopólio da União, portanto sujeito à influência política, e num mercado no qual há dificuldade para crescer. "Claramente, essa operação influencia na precificação da Eletrobras, porque é um ativo relevante", disse. Ela sugere que, na medida em que a Eletrobras solidifique sua gestão profissional e privada, poderá tentar se desfazer do ativo, já que ele não agrega valor no portfólio da empresa.

Para um profissional de um grande banco estrangeiro, que também falou na condição de anonimato, a Eletronuclear tende a ser avaliada com valor zero na precificação da oferta de ações da Eletrobras. No entanto, ele classificou como baixo o risco de a empresa privatizada ter de fazer um aporte para concluir a usina de Angra 3 como aventado por outro especialista. "O governo, que passará a ser o controlador, se comprometeu a encontrar um terceiro para terminar as obras", argumentou.

Como passará a ser um investimento minoritário, a Eletronuclear passará a entrar no balanço da Eletrobras via equivalência patrimonial. A empresa registrou em 2021 um prejuízo líquido de R$ 530,255 milhões, revertendo o lucro de R$ 108,6 milhões anotado em 2020. Com isso, os prejuízos acumulados somavam R$ 4,639 bilhões ao fim do ano passado. O Patrimônio Líquido da empresa estava avaliado em R$ 2,57 bilhões, segundo seu balanço, e o capital social, em R$ 8,49 bilhões.

Mais riscos

Para um analista de mercado que acompanha a empresa, entre os principais riscos para a Eletrobras privatizada estão fatores como o contencioso relacionado ao imbróglio dos empréstimos compulsórios, que resultam em provisões bilionárias para a empresa, e os riscos relacionados à definição do novo time de gestão e de abordagem estratégica.

Já entre os principais fatores a impulsionar o valor da Eletrobras com a privatização, ele cita a descotização das hidrelétricas, com a outorga de novos contratos, que permitirão à empresa negociar energia dessas usinas a valores de mercado, e não mais a operação e manutenção, como ocorre atualmente. O acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) estabeleceu em R$ 67,45 bilhões o valor adicionado pelos novos contratos de concessão.

Além disso, ele citou a diminuição de custos - com um corte estimado em 30% -, a redução do custo de capital e a otimização da estrutura de capital como principais fatores de valorização da companhia em curto e médio prazos. Outros potenciais benefícios estariam relacionados à redução de passivos, utilização de créditos fiscais e potenciais movimentos de crescimento - incluindo participação em futuros leilões, fusões e aquisições ou rotação de ativos -, além da criação de uma área de comercialização mais atuante. "Mas sobre estas alavancas ainda existem mais dúvidas e seu retorno deve demorar mais tempo para ser visto", disse.

Contato: Luciana.collet@estadao.com
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