Economia & Mercados
22/07/2022 17:58

Especial: Avanço de marcos setoriais dá novo impulso para emissões de debêntures incentivadas


Por Juliana Estigarríbia

São Paulo, 21/07/2021 - Com a redução do investimento público em infraestrutura nos últimos anos, incluindo a atuação do BNDES em projetos tocados pela iniciativa privada, o volume de recursos provenientes de emissões de debêntures incentivadas vem crescendo no financiamento de projetos do setor. No entanto, a instabilidade de regras em algumas áreas ainda limita a expansão desse instrumento.

Segundo estudo da FGV, obtido com exclusividade pelo Broadcast, enquanto os desembolsos do BNDES para infraestrutura caíram de R$ 69 bilhões, em 2014, para R$ 27,4 bilhões em 2020, o volume de debêntures incentivadas aumentou de R$ 4,8 bilhões para R$ 18,6 bilhões no mesmo período. O capital público era o principal financiador de infraestrutura no País até recentemente, sendo responsável por 45,7% dos investimentos em 2014.

A Lei nº 12.431, de 2011, criou uma classe especial de instrumento de dívida, a debênture incentivada - também chamada informalmente de debênture de infraestrutura - para financiar projetos considerados prioritários pelo governo. Desde a aprovação da lei, aproximadamente 70% do volume de recursos dessas emissões foi destinado ao setor de energia elétrica.

Ao conceder isenção fiscal a investidores individuais, a modalidade promoveu um aumento significativo de investimentos do mercado de capitais no setor, afirma a FGV. Como reflexo do incentivo, pessoas físicas foram responsáveis pela compra direta de 25,38% das debêntures incentivadas emitidas no mercado primário desde sua criação, mostra o estudo. Indiretamente, esses investidores também alocam seus recursos para infraestrutura por meio dos fundos de investimento dedicados a essa classe de ativos, igualmente usufruindo de incentivo fiscal.

"Diante da queda dos desembolsos do BNDES, houve um crescimento dos recursos via debêntures incentivadas para o setor. Isso foi fundamental para a entrada de pessoas físicas no financiamento da infraestrutura, esse bolsão de investidores não existiria se não fosse a lei de 2011. Nesse sentido, o incentivo cumpriu o seu papel", avalia o pesquisador do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV EAESP, Gustavo Velloso Breviglieri.

Apesar do êxito da lei, o responsável por operações de Renda Fixa no Itaú BBA, Guilherme Maranhão, aponta que históricos de judicialização podem limitar a expansão da modalidade em alguns setores. "O fato de termos mais emissores (de debêntures incentivadas) em energia elétrica ocorre porque o setor não tem grandes volatilidades nem histórico de quebra de contrato. Isso facilita tanto em relação ao volume de operações realizadas quanto aos prazos (dos títulos), que são mais longos."

Ele pondera que o nome por trás das emissões facilita a atração de mais recursos. "Companhias de médio porte têm acesso a debêntures de infraestrutura, mas em outro nível. Quando a empresa tem um nome muito conhecido, a amplitude de investidores é maior", esclarece. "Mas também temos casos bem-sucedidos de emissões para projetos específicos, como o de Pipa (corredor rodoviário de Piracicaba-Panorama)", acrescenta.

O responsável por mercado de capitais no UBS BB, Samy Podlubny, observa que nomes conhecidos geram "conforto" para atração de pessoas físicas. "Ainda que a debênture incentivada não vá num primeiro momento para pessoas físicas, o objetivo é que isso flua para o varejo, são eles que se beneficiam do incentivo tributário", explica. "Para esse público, um nome conhecido gera conforto, pois as pessoas físicas geralmente não têm a sofisticação de um investidor institucional qualificado, que pode fazer uma melhor análise de risco. É natural que mais recursos sejam destinados para grandes empresas estabelecidas."

Podlubny salienta que empresas de porte menor invariavelmente acabam pagando um prêmio maior, mas mesmo assim têm acesso a debêntures incentivadas. "Projetos bons, que param em pé, ganham dinheiro. É natural que empresas muito grandes recebam mais recursos, mas também existem operações não tão expressivas."

O sócio da área de infraestrutura do Pinheiro Neto Advogados, Ricardo Russo, acredita que a aprovação de marcos regulatórios recentemente, como de saneamento e ferrovias, podem estimular a emissão de debêntures incentivadas e ampliar seu escopo. "Todos esses leilões de infraestrutura que estão saindo não têm recursos do BNDES para financiamento do projeto, o próprio banco de fomento incentiva as companhias a buscar (recursos) no mercado de capitais."

Ele acrescenta que no caso do leilão da Cedae, por exemplo, os primeiros empréstimos feitos pelas empresas vencedoras foram via debêntures. "Espera-se que parte do financiamento de longo prazo também seja feita via mercado de capitais."

O sócio de infraestrutura do Machado Meyer, Alberto Faro, acredita que o volume de operações de debêntures incentivadas deve seguir em alta. "Não me parece que o cenário macroeconômico terá um grande efeito para barrar essas operações, o acesso a recursos para financiar infraestrutura não é fácil no Brasil e o setor precisa de financiamento para bons projetos", avalia.

Em sua visão, hoje no mercado de infraestrutura é mais importante ter um bom projeto. "Bons projetos estão estruturados para serem capazes de entregar uma remuneração compatível com o que os investidores esperam. Não existem muitas outras opções no mercado."

Maranhão, do Itaú BBA, relata que os investidores estão olhando para infraestrutura com mais oportunidade. "O próprio aumento recente da taxa de juros levou as pessoas a olharem para o setor com mais cuidado."

Para Podlubny, do UBS BB, projetos grandiosos de infraestrutura poderiam ter mais recursos via papéis incentivados. "Investidores estão atrás de oportunidade de renda fixa, mas existem diferenças de um setor para o outro. Em energia, existem poucas dúvidas em relação ao marco regulatório. Em outros setores, temos alguns sustos que podem afetar a atratividade."

Contato: juliana.estigarribia@estadao.com
Para ver esta notícia sem o delay assine o Broadcast+ e veja todos os conteúdos em tempo real.

Copyright © 2024 - Todos os direitos reservados para o Grupo Estado.

As notícias e cotações deste site possuem delay de 15 minutos.
Termos de uso