Economia & Mercados
17/10/2022 07:32

Especial: Líderes veem crise mais longa e exaltam ataque à inflação em reuniões do FMI


Por Aline Bronzati, enviada especial

Washington, 16/10/2022 - O cenário sombrio que paira sobre o mundo vai se arrastar por mais tempo, espalhando o risco de recessão nas economias, sobretudo, em países da Europa e nos Estados Unidos, na opinião de líderes que participaram das reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI). Apesar de terminarem sem uma solução, o diagnóstico foi o de que as ameaças inflacionárias são persistentes e têm de ser encaradas de frente, enquanto a proteção aos mais vulneráveis precisa ser reforçada para que cicatrizes ainda mais profundas do cenário de preços e juros mais altos sejam contidas.

No centro das preocupações dos líderes globais, a guerra na Ucrânia, em seu oitavo mês. Os embates em torno do tema, aliás, fizeram com que novamente o G20, grupo que reúne as maiores economias do mundo e que inclui o Brasil, e o Comitê Monetário e Financeiro Internacional (IMFC, na sigla em inglês) não divulgassem um comunicado consolidado de seus encontros anuais.

Apesar disso, houve o consenso em torno da necessidade de mais ajuda financeira, com a realização de uma segunda reunião de apoio ao povo ucraniano. Cálculos do FMI apontam que a Ucrânia precisará de US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões por mês no próximo ano. Nesse sentido, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, afirmou que os US$ 4,5 bilhões aprovados pelo Congresso norte-americano começarão a ser liberados em breve.

"Por mais difícil que seja cada uma de nossas posições, isso não é nada comparado ao sofrimento infligido ao povo da Ucrânia", afirmou o presidente do Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês), Andrew Bailey, a uma plateia de banqueiros centrais, neste sábado.

Na esteira da guerra, a segunda maior preocupação dos líderes globais é a escalada de preços no mundo e a perspectiva de que os juros terão de subir mais para botá-los nos trilhos. Para a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, a inflação é "teimosa", mas os bancos centrais podem ser ainda mais. "A inflação é um tremendo risco para o crescimento e o bem-estar das pessoas. Portanto, temos de nos concentrar no significado, a luta contra ela para os bancos centrais em quase todos os lugares", disse.

Na visão de Georgieva, o ambiente político atual é "muito mais complexo" do que o vivenciado em 2020, quando foram diagnosticadas as consequências econômicas da covid-19. No entanto, ela afirmou que sai das reuniões anuais do FMI, que terminam hoje, em Washington, com mais "otimismo", diante da constatação que há um foco maior em torno da necessidade de estabilizar a economia mundial e a colocar em "bases sólidas". Nesse sentido, reforçou a necessidade de um "trabalho integrado" e pediu o compromisso dos líderes na superação aos desafios e ainda no apoio aos mais vulneráveis.

"A inflação ainda é um grande problema para todos, mas, especialmente, para os mais pobres", disse o presidente do Banco Mundial, David R. Malpass, reforçando o coro.

Durante reunião do Comitê do FMI, os países mais frágeis se lamentaram e os mais avançados reconheceram a necessidade de atacar a inflação. O presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), Jerome Powell, sinalizou que os juros continuarão subindo nos EUA e ainda não é possível prever até quando. Já a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, afirmou que os bancos centrais não têm coração, ao ser cobrada por outro líder.

"Se você evita o que tem de ser feito em economia, o custo é muito maior", alertou o ministro da Economia, Paulo Guedes, na reunião, que, segundo ele, teve tom pessimista e cético. "Tudo o que os avançados têm de fazer ainda, o Brasil já fez. Já fomos ao fundo do poço e estamos voltando. Os avançados ainda estão indo", disse ele, a jornalistas.

Líderes globais também foram alertados durante os encontro sobre a importância de atentar à política fiscal enquanto a monetária aperta as condições financeiras das principais economias ao redor do globo. "Quando a política monetária coloca o pé no freio, a fiscal não deve pisar no acelerador. Se fizerem, correm o risco de entrar em trajetória muito perigosa", disse Georgieva, do FMI.

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou que "quem sentar na cadeira" da Presidência no Brasil terá de olhar para o lado social e fiscal. "Se você escolher demais no social, o mercado irá puni-lo e você terá o resultado oposto do que deseja. Se você fizer muito no fiscal, será muito difícil fazê-lo política e socialmente", afirmou, acrescentando que esse é exatamente o desafio.

Um terço em recessão

As reuniões do FMI também confirmaram números mais céticos para a economia global. O Fundo piorou suas projeções para a economia mundial em 2023 e passou a prever recessão na Alemanha e na Itália, além da Rússia. Para o fundo, um terço das economias deve enfrentar ao menos dois trimestres consecutivos de contração entre este e o próximo ano. O organismo espera que o Produto Interno Bruto (PIB) global cresça 2,7% em 2023, desacelerando de 3,2% neste exercício.

Apesar disso, a consultoria Oxford Economics considerou as novas projeções do FMI "muito otimistas". A britânica prevê uma desaceleração mais intensa, com a economia global crescendo só 2% em 2023. "O FMI estima que o crescimento global em 2023 será semelhante ao de 2019 - suave, mas não um desastre - e que uma recessão global provavelmente será evitada. Nossas previsões são muito mais fracas e achamos que a economia global está à beira da recessão", avaliou, em comentário a clientes, acrescentando que os EUA, o Canadá e a maior parte da Europa devem ver suas economias encolherem no próximo ano.

Contato: aline.bronzati@estadao.com
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