Economia & Mercados
17/12/2021 17:26

Especial: Aumento de juro neutro do BC consolida mudança do arcabouço fiscal, dizem economistas


Por Cícero Cotrim

São Paulo, 17/12/2021 - O Banco Central (BC) referendou a percepção de deterioração fiscal causada pela alteração do teto dos gastos ao aumentar de 3% para 3,5% a sua premissa de juro real neutro no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) de dezembro, segundo economistas ouvidos pelo Broadcast. Apesar do aumento, a projeção da autarquia continua abaixo da mediana do questionário pré-Copom de dezembro, de 4,0%.

"O BC não apresentou uma explicação para essa estimativa mais alta, mas, na nossa opinião, ela se deve ao enfraquecimento do arcabouço fiscal causado pela mudança da regra do teto dos gastos", comentaram a economista-chefe do Credit Suisse no Brasil, Solange Srour, e o economista Lucas Vilela. Nas suas projeções, o banco assume um juro neutro real de 3,5%, mas alerta que os riscos são para cima sem avanços no front fiscal.

Para o economista-chefe da ASA Investments, Gustavo Ribeiro, a mudança da premissa de juro real neutro do BC foi uma surpresa positiva que reforça a credibilidade da autarquia. Antes da pandemia, a gestora trabalhava com uma estimativa de taxa estrutural de 3,0% e com viés de queda, mas os seus modelos passaram a sugerir um nível entre 4,0% e 4,5% após as alterações no arcabouço fiscal.

"Vale pontuar que esses 3,5% não são necessariamente o juro neutro que o BC usa nas projeções relevantes para o Copom", diz Ribeiro."Da maneira como eu entendo, o BC faz uma média ponderada de cenários, que leva a um juro neutro implícito mais elevado do que o do cenário-base. O BC está dizendo que o piso subiu de 3,0% para 3,5%."

A ASA Investments estima uma taxa real neutra de 4,0%, em um cenário intermediário no qual os gastos públicos retomam um crescimento real anual de 2,0% a partir de 2022 - ainda abaixo da média do período pré-teto dos gastos, entre 6,0% e 7,0% ao ano. Para Ribeiro, a tendência do juro neutro é ascendente, mas não deve sofrer pioras relevantes sem uma deterioração adicional do fiscal ou do potencial de crescimento do País.

"Os cenários que estão sendo colocados na mesa não contemplam um Orçamento do governo que não seja crível, nem um total descarrilamento fiscal", explica o economista. "Em um cenário hipotético, que acho que tem probabilidade baixa, de começarmos, por exemplo, a discutir um aumento do Auxílio Brasil no ano que vem, se ficar muito claro que o crescimento real das despesas vai ficar acima de 2,0%, acho que haveria revisões."

O economista-chefe da Kínitro, Sávio Barbosa, diz que os modelos da gestora sugerem uma taxa real neutra entre 4,0% e 4,5%, em um cenário que não considera novas alterações da política fiscal. "O BC está se aproximando da estimativa feita pelo mercado, e parte disso incorpora a mudança do arcabouço fiscal, com um choque relevante dessa elevação do teto [dos gastos], de aumentar o pé-direito do teto", diz Barbosa. "Se o dano foi esse que foi feito, se não tivermos uma deterioração adicional, acreditamos que essa leitura de uma taxa de equilíbrio próxima de 4,0% seria compatível com o que já foi promovido."

O economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otávio de Souza Leal, avalia que a flexibilização do arcabouço fiscal do País deixa clara uma tendência de alta do juro neutro, embora ainda seja cedo para chancelar um novo nível. Uma alteração efetiva da taxa vai depender da política fiscal adotada pelo próximo governo e, em especial, da possibilidade de adoção de uma nova âncora fiscal, afirma.

"Eu diria que a gente começou um processo muito parecido com o segundo mandato de Lula, o primeiro mandato de Dilma [Rousseff], quando o arcabouço fiscal começou a ser desmontado", diz Leal. "Esse desmonte não acontece de uma hora para a outra, ele é um processo. Do mesmo jeito, a piora para sair de um juro neutro de 3,0% ou 3,5% e ir para 4,0% é um processo. A gente só vai saber a partir de 2023."

Contato: cicero.cotrim@estadao.com
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