Política
27/02/2020 15:25

Pew Research Center: Liberdade de oposição é valor democrático com menor apoio entre 34 países


Por Paulo Beraldo e Thaís Ferraz

São Paulo, 27/02/2020 - A liberdade de partidos de oposição a governos de atuar livremente é o valor democrático que obteve o menor apoio numa pesquisa que contemplou 34 países. Apenas 54% dos entrevistados afirmaram acreditar ser importante que a oposição possa atuar com liberdade. Rússia (23%), Indonésia (24%), Líbano (35%) e Brasil (36%) foram os quatro piores classificados nesse quesito.

Grécia (75%), Suécia (73%) e Reino Unido (72%) foram os melhores. A liberdade de oposição é um valor mais bem avaliado na Europa, onde em oito nações mais de 60% da população apoia essa possibilidade. Na Argentina, 65% concordam com essa ideia, e no México, 43% dos que responderam à entrevista.

Conduzida pelo Pew Research Center, de Washington, a investigação ouviu 38.426 pessoas. Os entrevistados deviam avaliar a importância de nove valores democráticos: justiça igualitária, igualdade de gênero, eleições regulares e liberdades religiosa, de expressão, de imprensa, na internet, de atuação de grupos de Direitos Humanos e de atividade de legendas de oposição.

Os dois últimos valores tiveram o pior desempenho no levantamento. O diretor do setor de Pesquisas de Atitudes Globais do Pew Research Center, Richard Wike, afirma que o resultado não significa, necessariamente, que os entrevistados sejam contrários a esses princípios. “O que percebemos é que, quando se trata da sociedade civil, esses quesitos tendem a ter uma prioridade menor para as pessoas, se comparados a outros, como a liberdade de expressão e a igualdade de gênero”, afirma.

Incompreensão

Na avaliação do pesquisador Cláudio Couto, coordenador do mestrado profissional em Gestão e Políticas Públicas (MPGPP) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (Eaesp-FGV), a baixa apreciação do papel da oposição decorre da incompreensão da função dela.

“A oposição tem função fundamental de exercer a crítica e apontar o dedo para problemas que porventura haja nos governos. Ao fazer isso, exerce um controle e uma limitação para não haver abusos de poder”, disse Couto, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP).

De acordo com ele, administrações populistas tentam deslegitimar a oposição ao qualificá-la como “inimiga do país” por ser adversária do governo. “Ela é legítima e é um contrapeso importante à ação do governo. É, no fundo, um aliado do país que pode fornecer alternativas no futuro”.

Segundo o cientista político norte-americano naturalizado brasileiro David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), a desarticulação e a passividade da oposição em alguns países aumenta a insatisfação com seu trabalho. “Nem sempre ela age fornecendo soluções, e isso faz parte do problema. As melhores avaliações estão na Europa, onde a oposição funciona melhor. São democracias mais enraizadas e sabe-se exatamente o que a oposição precisa fazer.”

Polarização

O estudo também mostrou que a polarização política que atinge muitos países, como os Estados Unidos e o Brasil, desempenha um papel fundamental na percepção que os cidadãos têm da democracia. “Em particular, o modo como uma pessoa se sente em relação ao partido que está no poder num país afeta muito como ela se sente em relação à democracia como um todo”, afirma Wike. “Quem está ao lado de um partido que não está no poder no momento tende a se mostrar mais insatisfeito com o regime democrático”.

As nações que mais aprovam o papel da oposição são também as que defendem com mais afinco a liberdade de expressão, de internet e de imprensa. O direito de dizer o que se pensa sem censura do Poder Executivo é mais difundido em países da Europa Ocidental, no Canadá e no EUA, onde mais de 65% aprovam essas liberdades.

Na Rússia, Tunísia, Líbano e Índia, os números não passam de 45% em nenhum dos três pontos. No Brasil, 70% apoiam a liberdade de expressão, 60% a de imprensa e 61% a de internet. Wike afirma que, nos últimos anos, aumentou o número de pessoas que classificam as liberdades relacionadas à comunicação como "muito importantes". “Isso pode ser uma reação ao fato de que princípios democráticos estão sendo desafiados em alguns países”, afirma. Em locais onde a liberdade de imprensa diminuiu, por exemplo, as pessoas tendem a valorizá-la mais. Em alguns casos, quanto maior for o desafio democrático de um país, mais as pessoas aprovarão os princípios democráticos.

Descrença

Conforme o trabalho, um dos principais motivos de insatisfação com o funcionamento da democracia é a descrença com as elites políticas. Em cada dez ouvidos, seis afirmaram que as autoridades eleitas não se importam com o que os eleitores pensam. Nesse ponto, as piores avaliações estão na Europa, com destaque para Grécia (apenas 13%) e Bulgária (17%), e as melhores, nas Filipinas (69%) e na Indonésia (67%) - duas ditaduras.

O princípio democrático mais defendido pelos entrevistados foi o sistema judiciário justo, com média de 82% de respostas positivas. Os países que mais valorizam essa ideia são Grécia e Hungria, com 95%. Os que menos a apoiam são Índia e Indonésia, com 58% e 60%, respectivamente. O Brasil está dentro da média - 81%.
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