Levantamento realizado pelo Broadcast, mostra que dos seis casos julgados, em 2024, e que estão listados no anexo de riscos fiscais da LDO de 2025, cinco tiveram resultado alinhado ao Fisco.
9 de janeiro de 2025
Por Lavínia Kaucz
A tendência do Supremo Tribunal Federal (STF) em tomar decisões favoráveis à União em casos com impacto bilionário para as contas públicas se manteve em 2024 e ajudou a reduzir pela metade o risco fiscal na Justiça. De acordo com levantamento realizado pelo Broadcast, dos seis casos julgados no ano passado que estão listados no anexo de riscos fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, cinco tiveram resultado alinhado ao Fisco. Ao todo, a União evitou perdas de R$ 870,6 bilhões com as decisões, segundo estimativa da Receita.
Mais da metade do valor se refere à decisão que anulou a “revisão da vida toda” das aposentadorias. A estimativa de gastos com o cumprimento da ordem pelo INSS era de R$ 480 bilhões. Em seguida vem a correção do FGTS, em que o risco fiscal em caso de derrota era estimado em R$ 295,9 bilhões.
As outras decisões favoráveis foram as que autorizaram o Executivo a alterar as alíquotas do Reintegra entre 0,1% e 3% (R$ 49,9 bilhões) e validaram a incidência de PIS/Cofins sobre a locação de bens móveis (R$ 20,2 bilhões) e bens imóveis (R$ 16 bilhões).
A validação do PIS/Cofins sobre as entidades fechadas de previdência complementar é mais um julgamento que foi favorável à União. Embora esteja listado na LDO – o que indica que tem impacto maior do que R$ 1 bilhão – a estimativa de gasto caso a União fosse derrotada não foi publicada.
Há ainda um processo em que a União saiu vencedora, mas não está listado na LDO. O Supremo decidiu que são válidas as ações rescisórias ajuizadas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para cancelar créditos da “tese do século”. De acordo com a PGFN, os créditos são de R$ 2,8 bilhões. O valor pode incluir receita nova, nos casos em que o contribuinte já obteve a compensação dos valores e terá que devolver à União. Outra parte, relativa aos casos em que a compensação ainda não foi efetivada, deixa de sair do Tesouro.
No início de dezembro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou o alinhamento com o Judiciário. “Nós tínhamos um mapa do risco fiscal judicial que era o dobro do atual”, disse. Na sua avaliação, as Cortes superiores têm adotado uma “abordagem consequencialista muito mais responsável”. Só no caso das ações tributárias contra a União no Supremo, o risco fiscal diminuiu de R$ 1,4 trilhão, em 2022, para R$ 716,6 bilhões, em 2024.
Com frequência, Haddad critica o julgamento da “tese do século”, que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins e já custou mais de R$ 300 bilhões ao governo. Há estimativas que apontam um impacto de mais de R$ 1 trilhão com até 2030. Para o ministro, a decisão contribuiu, em grande medida, com o déficit vivido hoje nas contas públicas. “O que aconteceu em 2017, uma derrota no STF que custou 10% do PIB, isso não vai mais acontecer”, disse Haddad em evento do BTG Pactual em agosto.
O resultado da “tese do século” foi alcançado em 2017 com um placar apertado, de 6 a 5. Desde então, houve quatro trocas de cadeira na Corte. Interlocutores na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) acreditam que, se o julgamento fosse realizado hoje, o resultado seria distinto.
O tributarista André Torres, sócio do Pinheiro Neto Advogados, vê uma “consolidação sobre a influência da pauta econômica no raciocínio do Judiciário”. Na visão do advogado, a preocupação em relação às contas do governo passou a ser mais presente nos julgamentos do Supremo a partir de 2022.
Para Torres, os advogados dos contribuintes devem entender esse novo momento e aprender a dialogar com o argumento econômico. “É importante conseguir mostrar que nem sempre essa visão é a única e a mais correta. Se formos capazes de argumentar que o outro lado da moeda do rombo orçamentário é um impacto econômico significativo nas empresas, para o mercado ou um setor inteiro, o Supremo tem dois pesos na balança”, avalia.
Cristiane Romano, sócia da área de Tributário do escritório Machado Meyer, também identifica uma “preocupação do STF em não criar impactos economicamente prejudiciais à Fazenda” ao invalidar normas. “Por isso é comum a modulação de efeitos da decisão. A modulação é tão presente – e gera frequentes discussões – que são criados outros temas para esclarecer e especificar o que foi decidido em modulação”, avalia a advogada, em relação ao instrumento utilizado pelos ministros para limitar o efeito das decisões.
Em nota, a PGFN disse que “intensificou seus esforços para fortalecer a cooperação com o Poder Judiciário e ampliar a participação da sociedade civil nas decisões que impactam o cenário tributário brasileiro”. Também afirmou que essa aproximação “contribuiu para uma maior previsibilidade das decisões judiciais e para a construção de um ambiente mais colaborativo”.
Derrotas
Também houve casos relevantes em que a União perdeu. O que consta na LDO foi o julgamento que declarou inconstitucional a alíquota de 25% do imposto de renda retido na fonte sobre as pensões e aposentadorias recebidas no exterior. A Receita estima impacto de R$ 6 bilhões com a derrota.
O Supremo também contrariou o governo ao acabar com a multa punitiva de 150% em caso de sonegação fiscal. Mas os ministros tomaram um “caminho do meio” e limitaram a multa a 100%, porcentual maior do que queriam os contribuintes (30%).
A Corte também proibiu a incidência do ITCMD – o chamado imposto de herança, cobrado pelos Fiscos estaduais – no repasse de valores de planos de previdência privada em caso de morte do titular.
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