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A tal pergunta

Eu estava distraído quando, de repente, ouço: “Como vai a economia?”

18 de outubro de 2024

Por Eduardo Laguna
Assisto ao Roda Viva, programa da TV Cultura, desde que me conheço por gente. Eu me lembro bem de quando, ainda moleque, meus pais sintonizavam o “canal 2” para, tarde da noite, assistirmos juntos a entrevista do Roda com algum figurão da época. Até hoje, com as plataformas de streaming, passo por vezes horas revendo algumas das edições históricas do programa, do tempo em que os entrevistadores fumavam na bancada. Entrevistas com convidados como Ayrton Senna, Rachel de Queiroz, Mano Brown, Orestes Quércia, esta marcada pela briga com o jornalista Rui Xavier, do Estadão, entre outros.

Então, quando eu me tornei jornalista, é claro que participar do programa passou a ser uma possibilidade e a mexer com a minha imaginação. É muito comum o entrevistado do Roda Viva abrir a entrevista manifestando a honra de estar no centro da roda. Não é diferente para quem está na bancada.

Tinha duas certezas sobre como eu reagiria se o convite visse. Uma é que eu não deixaria a oportunidade passar. A outra é que, assim que aceitasse, eu me tornaria uma pilha de nervos. E foi exatamente isso que aconteceu na semana passada, quando chegou a “convocação” para eu compor pela primeira vez a bancada do Roda Viva para uma entrevista ao vivo com o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Passei a pesquisar ao máximo, nos dias seguintes, tudo o que poderia ser pauta da entrevista. Bolei 17 possíveis perguntas. Afinal, quanto mais eu me preparasse, menor seria a minha insegurança durante o programa. Mesmo assim, a tensão diminuiu muito pouco.

Quando chegou, enfim, o grande dia da entrevista, o motorista enviado pela Cultura chegou a meu endereço três horas antes de o programa entrar no ar – a propósito, a produção faz de tudo para que o entrevistador não tenha que se preocupar com nada além da entrevista. Sem muito trânsito no caminho, fui o primeiro convidado a chegar. Fui conduzido diretamente ao camarim, onde conheci a apresentadora do Roda Viva, Vera Magalhães, e recebi os primeiros cuidados de uma das maquiadoras.

Logo depois, fui levado a uma sala de espera, onde foram chegando assessores de Alckmin, diretores da Fundação Padre Anchieta, entrevistadores e, por fim, o entrevistado. Alckmin cumprimentou a todos, tirou fotos, conversou com quem estava na sala. Eu estava distraído quando, de repente, ouço uma pergunta: “Como vai a economia?”. Era o próprio vice-presidente querendo saber a minha opinião.

Acompanhar a economia é o meu trabalho, que tem entre as suas frentes cobrir a gestão de Alckmin à frente do ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Poderia dizer que a economia realmente tem surpreendido, mas que ainda há muita apreensão no mercado em relação à política fiscal. Que os juros estão subindo novamente, podendo esfriar a recuperação do setor industrial. Que a indústria espera uma resposta do governo à crescente entrada de produtos chineses.

Mas a verdade é que fiquei sem saber o que responder. O vice-presidente me ajudou: “Está andando, né?”. Só me restou concordar para, de imediato, perguntar o que ele tinha achado da entrevista que concedeu alguns dias antes ao Dois Pontos, programa do Estadão comandado pela jornalista Roseann Kennedy, do qual também participei.

Neste momento, a produção do Roda Viva já nos chamava para adentrar o estúdio. Notei que a plaquinha com meu nome estava posicionada à direita de Vera Magalhães, o que significava que eu seria o último a perguntar, uma vez que a roda do programa não gira em sentido anti-horário.

Programa no ar, não consegui perguntar no primeiro bloco, porém Vera avisou aos telespectadores que na volta do intervalo eu faria a primeira pergunta. Sobe a angústia: “Será que vou gaguejar?”; “Será que vou virar meme?”; “Será que vou me esquecer da pergunta?”.

Voltamos do intervalo e Vera me passa a bola. A voz saiu, consegui fazer a pergunta sem perder o fio da meada e passei para o vice-presidente responder. Pronto, toda a tensão passou, as dúvidas pararam de me consumir, e a partir dali já estava à vontade para perguntar sobre qualquer assunto ao nosso entrevistado, inclusive sobre “como vai a economia”.

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