Selecione abaixo qual plataforma deseja acessar.

Leve-me a Tchôruglu

Barreiras logística e linguística me transportaram para o dia 10 de novembro de 2025 em Belém, no Pará, na COP30

21 de novembro de 2024

Por Karla Spotorno

“Moço. Por favor. Eu preciso ir para aquele lado. Preciso ir ali, no metrô Koroglu (lê-se, Tchôruglu).” Essa era eu, traduzida e aflita, no quarto dia de cobertura da COP29 e na quarta vez em que o Bolt me levava a um lugar distante do ponto exato para eu pegar o ônibus até a sede do evento. A oferta de mais de uma dúzia de linhas de ônibus era a melhor forma de chegar até o Estádio Olímpico de Baku. Isso porque carros particulares -inclusive de transporte de passageiros – eram impedidos pelas dezenas de policiais de trafegar em trechos de avenidas e rodovias. E para quem está se perguntando: sim, eu digitava o endereço certo no app do Bolt.  

Para quem não sabe, como eu não sabia antes de pesquisar sobre Baku, o Bolt é o Uber que funciona na capital do Azerbaijão. Funciona se o usuário informa que vai pagar em dinheiro, em manats. Em cartão de crédito, nem eu, nem os colegas próximos conseguiram transporte. Até tem Uber em Baku. Mas é como ouvimos em cidades brasileiras: “tem, mas acabou”. Não consegui pegar unzinho sequer.

A dificuldade logística – geralmente, provocada pelas mudanças constantes no trânsito justificadas na segurança das autoridades – ganhava ares de “socorro-vou-me-atrasar” pela dureza de não falar azerbaijani ou azeri. A língua é muito similar ao turco. Inclusive, a população se reconhece etnicamente turca. Como me explicou o embaixador brasileiro no Azerbaijão, Manuel Montenegro, os dois países costumam dizer que são dois Estados, uma nação. Então, felizes dos passageiros estrangeiros em Bolts que falam turco. Mas, enfim, esse não era o meu caso.

Para se ter uma ideia do quanto eu acreditava na universalidade do inglês numa capital que recebe anualmente o GP de Fórmula 1, eu sequer tinha baixado no meu celular um aplicativo de tradutor simultâneo*. Tratei de baixar e aprender a usar no primeiro dia. Quando minha proficiência em mímica não era suficiente, era a tecnologia que me ajudava a chegar ao meu destino.

Essas duas barreiras que vivi -a logística e a linguística – me transportam imediatamente para o dia 10 de novembro de 2025 em Belém, no Pará. É nesse dia que começa a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Algumas dezenas de milhares de pessoas são esperadas para a COP30, a grande maioria que sequer entende o transcontinental portunhol. Então, fico me perguntando como o ir e vir, o comer, e o se achar na capital paraense vai acontecer.

Não tenho a menor ideia. Só sei que a simpatia, a gentileza e a “vontade-de-fazer-dar-certo” azerbaijanas certamente estarão presentes na conferência brasileira. E, sim, isso é uma grande parte da receita do sucesso de uma COP.

Tão longe, tão perto

A minha dificuldade particular de chegar na sede da COP29 era minha metáfora diária sobre a complexidade do debate no único fórum multilateral e democrático para discussão da crise do clima global. Embora perto uns dos outros, delegados dos 196 países estavam – e ainda estão – muito longe de um consenso.

Era assim que eu me sentia. Tão longe e tão perto do meu objetivo. Da minha janela, eu via o estádio olímpico e suas bonitas luzes noturnas. Para chegar lá, entretanto, um oleoduto e  um gasoduto, uma rodovia e regras mutantes de trânsito me impediam de avançar com tranquilidade.

A um dia do fim da COP29, espero que flua melhor essa corrida por um consenso entre países desenvolvidos e aqueles mais suscetíveis à urgência climática. Até agora, a conversa sobre financiamento climático não andou nada bem.

*Uma última curiosidade. O azeri é tão difícil para ouvidos ignorantes que nem o app de tradução oferecia a pronúncia das palavras. Haja mímica.