União deve ter derrotas no Supremo Tribunal Federal (STF) por questionamentos sobre reforma
18 de setembro de 2024
Por Amanda Pupo e Lavínia Kaucz
O governo deve sofrer derrotas no Supremo Tribunal Federal (STF) em ações que questionam a reforma da Previdência que terão um impacto fiscal de pelo menos R$ 132,6 bilhões.O número é apontado em nota técnica da Advocacia-Geral da União (AGU) obtida com exclusividade pelo Broadcast. Embora o julgamento das ações na Suprema Corte esteja suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes feito em junho, outros dez ministros já votaram e formaram maioria para derrubar quatro trechos da reforma.
Em dois deles, a União deverá ser impedida de acionar gatilhos que poderiam reduzir o déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) em R$ 126,5 bilhões. Também foi formada maioria para derrubar o artigo que cria cálculos diferenciados para as alíquotas da contribuição paga por mulheres no regime geral e no regime do serviço público. Esse último caso tem risco fiscal estimado em R$ 6,1 bilhões para o RPPS, de acordo com a nota da AGU. Até a proclamação do resultado, os integrantes da Corte ainda podem alterar seus votos.
Os reveses para a reforma da Previdência, em vigor desde 2019, acontecem num momento em que especialistas já alertam sobre a necessidade de um novo endurecimento das regras, diante do rombo cristalizado nas contas públicas que deve se aprofundar nos próximos anos. Para 2025, o déficit projetado para o Regime Próprio dos servidores civis da União é de R$ 56 bilhões, o que corresponde a 0,49% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2026, a previsão é de um saldo negativo de R$ 61,6 bilhões, ou seja, 0,50% do PIB projetado.
No caso do Regime Geral, o rombo previsto para este ano é de R$ 272,5 bilhões, ou 2,4% do PIB. Como mostrou o Broadcast recentemente, para 2025, a cifra fica praticamente estável em relação ao PIB, mas economistas acreditam que o déficit pode saltar para 10% da economia brasileira em trinta anos.
Questionamentos
A reforma da Providência proposta pelo governo de Jair Bolsonaro previa uma economia inicial de R$ 1 trilhão em 10 anos, mas o texto aprovado em outubro de 2019 garantiu um impacto de cerca de R$ 800 bilhões, segundo as contas da equipe econômica da época.
Se, por um lado, a reforma feita é considerada insuficiente, por outro, nem sua integralidade está garantida, diante do quadro no STF. O assunto chegou à Corte por um conjunto de 13 ações, que, se aceitas pelo STF, representariam um aumento no déficit atuarial do RPPS no valor de R$ 497,9 bilhões, um dos maiores riscos fiscais contabilizados no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do próximo ano. No total, as demandas judiciais contra a União somam um risco fiscal de R$ 1,170 trilhão.
O montante é visto como conservador porque não inclui os R$ 126,5 bilhões referentes a dois trechos que representariam, segundo a AGU, “tão somente uma mera possibilidade de redução do déficit”. Isso porque se trata, na prática, de gatilhos que poderiam ser acionados pela administração pública. Um desses artigos já considerado inválido pela maioria dos ministros prevê que, quando houver rombo na Previdência, a base de cálculo da contribuição de aposentados e pensionistas (inativos) pode ser ampliada – a regra geral é que a base não pode ser maior do que um salário mínimo. A governo estima que perde a chance de reduzir o déficit atuarial em R$ 55,1 bilhões.
Outro ponto estabelece que, se a ampliação da base de cálculo não for suficiente para equilibrar o rombo, pode ser criada contribuição extraordinária para inativos e servidores públicos. A perda dessa alternativa impede a redução do saldo negativo em R$ 71,4 bilhões, segundo a AGU.
Os números foram levantados em novembro do ano passado pelo Ministério da Previdência Social e repassados à AGU, que faz a defesa da União no STF. Segundo a nota técnica da AGU, todos os impactos referentes às regras de cálculo e de concessão dos benefícios foram calculados sobre os futuros benefícios, não abrangendo os benefícios já em andamento, “uma vez que estes foram considerados como direito adquirido, não sendo, portanto, atingidos por futuras alterações na legislação”.
Por último, a Corte já tem oito votos para invalidar o trecho da reforma que anula as aposentadorias já concedidas por contagem recíproca (soma do tempo de contribuição no regime geral e no regime do serviço público) sem o recolhimento da respectiva contribuição.
A prática ocorria principalmente no meio jurídico: ao ingressarem na magistratura, advogados que atuavam como profissionais liberais conseguiam contabilizar o tempo de serviço anterior para a aposentadoria, mesmo sem demonstrar o pagamento ao INSS. A reforma passou a exigir a comprovação da contribuição.
De acordo com os votos proferidos até agora, a regra não pode alcançar o passado, o que exclui a possibilidade de a União entrar com ações rescisórias para desfazer as decisões que favoreceram esses trabalhadores. Nesse caso, não há estimativa de impacto para as contas públicas, assim como sobre outros pontos que o governo alega não ser possível mensurar o efeito da regra.
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