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Chegou a hora do mercado brasileiro de crédito pisar no freio, diz presidente do Bradesco

Banco já está operando com apetite a risco controlado e com modalidades de crédito mais seguras

20 de janeiro de 2025

Por Aline Bronzati, correspondente

O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, admite que chegou a hora de o mercado brasileiro de crédito pisar no freio diante da expectativa de novos aumentos de juros no Brasil. Empresas de pequeno e médio porte devem ser mais impactadas do que as grandes e a pessoa física, na sua visão. “O apetite a risco do sistema para 2025 vai ser menor”, diz Noronha, em entrevista ao Broadcast, diretamente de Zurique, na Suíça, escala que fez antes de ir a Davos, onde participa pela primeira vez do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês). Para ele, o crédito vai desacelerar e crescer abaixo da projeção da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que indica alta de 9% em 2025. Quanto ao Bradesco, diz que o banco já está operando com apetite a risco controlado, com modalidades de crédito mais seguras. E, a despeito da crise do Pix, o que vai ditar os resultados nas eleições de 2026 é a economia, na sua opinião.

Broadcast: A Fitch Ratings fez um alerta quanto ao risco de novos aumentos de juros no Brasil este ano acelerar o downgrade de empresas brasileiras. Quais são os setores que preocupam mais neste cenário?

Marcelo Noronha: As 436 empresas de capital aberto no Brasil têm um grau de alavancagem controlado. Não existe nunca. Sempre tem um ou outro caso. Mas eu não vejo um cenário se deteriorando brutalmente. As empresas de médio porte tendem a sofrer mais porque não são tão capitalizadas, às vezes, são um pouquinho mais alavancadas. É o outro lado da moeda. Então, esse cenário pode impactar mais as pequenas e médias empresas do que as grandes, menos na pessoa física porque o nível de desemprego está controlado, e algumas linhas específicas de crédito.

Broadcast: Quais?

Noronha: O crédito imobiliário na linha convencional do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) tem uma taxa de juros tabelada de 12% mais 0,5%. Hoje, está abaixo do custo de dinheiro na curva longa de juros. Todos os bancos já usaram mais do que o estoque de poupança e aquelas outras emissões que podiam fazer. Então, eu vejo essa linha desacelerando no Brasil. Então, isso bate na compra de imóveis, nesse giro do setor. Por outro lado, tem o lado positivo do agronegócio e, com esse câmbio, os exportadores nadam de braçadas. Isso pode, inclusive, no saldo comercial zerar, independentemente do investimento estrangeiro direto.

Broadcast: O aumento de juros já está batendo na inadimplência?

Noronha: O banco está operando com apetite a risco controlado, com modalidades de crédito mais seguras.

Broadcast: Em nossa última entrevista, o senhor disse que se tivéssemos um cenário de estresse, o Bradesco iria puxar o freio no crédito. Chegou esse momento?

Noronha: Esse momento chegou para o sistema. O apetite a risco do sistema para 2025 vai ser menor. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) divulgou uma perspectiva de crescimento da carteira de crédito entre 9% e 10%. Vamos ver índices menores do que as projeções e do ritmo de expansão visto no ano passado.

Broadcast: Na semana passada, o Bradesco acessou o mercado externo, obteve demanda e até mesmo uma taxa menor que o previsto. Como está o humor do investidor estrangeiro com o Brasil frente a este mundo sob cautela e a persistência do temor fiscal no País?

Noronha: Tem apetite estrangeiro para Brasil dependendo da companhia. Mas, do outro lado, tem um conjunto de investidores que não quer colocar dinheiro no País enquanto não tiver certeza de como o Brasil vai navegar com o câmbio e a taxa de juros. O investidor de longo prazo que está fazendo investimento em infraestrutura continua vindo, mas, para o de renda variável, não tem Brasil. É só os Estados Unidos.

Broadcast: Tivemos uma onda de fake news no Brasil sobre o Pix. Essa crise compromete a ferramenta que teve tanto sucesso no País?

Noronha: Uma coisa é passar informação à Receita Federal, outra é tributar. Eu não vi essa intenção. O que a medida visava é algo que fazemos há mais de 20 anos em que todo consumo de cartão de crédito da pessoa física acima de R$ 5 mil é informado para a Receita Federal. E na pessoa jurídica, as transações acima de R$ 10 mil também são informadas. Qual é o problema de informar os outros meios de pagamentos? Nenhum. É um cruzamento de dados natural da Receita Federal.

Broadcast: Em paralelo à crise do Pix, a Meta, dona do Facebook, decretou o fim do seu sistema de checagem de informação. Quais são os riscos ao sistema financeiro, às economias?

Noronha: Eu não encaro isso de outra maneira. Nas redes sociais, temos uma discussão à parte. Agora, na questão do Pix, foi mais falta de entendimento do propósito do que qualquer outra coisa. Foi uma questão de informação. Não tinha nada a mais do que isso. As outras discussões são vieses momentâneos. Acho que essa crise do Pix já vai acabar.

Broadcast: Mas as fake news continuam. A volta de Donald Trump e as crises no Brasil, o fiscal, agora o Pix, antecipam e complicam as eleições de 2026 no País?

Noronha: Não. O quadro eleitoral para 2026, a gente vai ver lá. Vai depender muito de como estará a economia, né? Está certo? Esse é o nome do jogo para qualquer candidato no Brasil. Essa questão com o Pix vai passar. Não estou perdendo o sono com isso. Nós temos de trabalhar, não tem muito tempo para gastar com certas coisas.

Broadcast: Falando em trabalhar, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não irá novamente a Davos. A ausência do chefe da equipe econômica enfraquece a participação do Brasil no Fórum? Os problemas locais são mais urgentes?

Noronha: É natural que o ministro da Fazenda seja uma figura importante em um Fórum desse, mas eu acho que é mais importante fazer o dever de casa interno do que participar do evento. Temos uma agenda mais importante no Brasil do que em Davos.


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