Instituições financeiras e construtoras já vislumbram cenário com novo ciclo de aperto monetário
26 de setembro de 2024
Por Circe Bonatelli*
Com a retomada do ciclo de alta dos juros básicos pelo Banco Central, as instituições financeiras e as construtoras já vislumbram uma elevação dos juros cobrados no crédito imobiliário.
A vice-presidente de Habitação da Caixa Econômica Federal, Inês Magalhães, afirmou que o banco vai manter a taxa inalterada neste ano caso o volume de financiamentos permaneça dentro do planejado. Já se a demanda for além, o banco avaliará uma subida.
“Para 2024, vamos trabalhar com essa taxa de juro (cerca de 9% a 10% ao ano). Para o orçamento de financiamento previsto, nós estamos tranquilos”, disse Magalhães. A Caixa liberou R$ 39,5 bilhões em crédito imobiliário neste ano até julho, o equivalente a 56,4% do teto do orçamento anual, de R$ 70 bilhões. “Se tivermos que ampliar o orçamento, aí teremos que precificar qual será a taxa”, ponderou.
Por sua vez, o sócio e diretor de Negócios Imobiliários do Itaú BBA, Bruno Bianchi, disse que há possibilidade de uma subida da taxa do crédito imobiliário nos próximos meses se não houver uma reversão nos rumos dos juros da economia brasileira – algo pouco provável no curto prazo. “É possível ver uma alta na taxa de juros do crédito imobiliário nos próximos meses se não houver uma mudança de tendência dos juros do País”, afirmou Bianchi. “Não tem muito como escapar dessa situação”.
Bianchi admitiu que essa não é uma notícia boa para o setor imobiliário, que tem uma demanda intensiva de capital seja para a construção de moradias quanto para a venda. Por outro lado, ele disse que há um esforço em segurar ao máximo as taxas, levando em conta que o crédito imobiliário é a maior carteira setorial, com inadimplência reduzida, e fidelização dos clientes por vários anos. “Qualquer ajuste será feito com parcimônia”.
O superintendente executivo de Empréstimos e Financiamentos do Bradesco, Thiago Lisboa Spessoto, disse que o ciclo de alta da Selic gera uma pressão relevante de elevação das taxas praticadas pelas instituições financeiras. “A pressão sobre o spread é na veia”, enfatizou.
Spessoto explicou que há um esgotamento na oferta de recursos da caderneta de poupança para abastecer o financiamento imobiliário. Dessa forma, os bancos têm buscado fontes alternativas de recursos, cujo custo de captação está atrelado à Selic. “Estaremos mais suscetíveis às variações dos juros. Se o juro sobe, põe pressão sobre o spread dos bancos”.
Os executivos participaram nesta semana do Fórum Incorpora, organizado pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), e também conversaram com a reportagem.
Perspectiva de alta
O diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Cyrela, Miguel Mickelberg, classificou como “frustrante” a mudança na direção da Selic, já que as previsões de economistas no início de 2024 era de um ciclo de redução dos juros ao longo do ano. “É uma frustração grande começar o ano esperando uma taxa de juro de um dígito e ver o cenário atual mudando completamente”, disse o executivo.
Mickelberg contou que, por ora, não houve mudança de taxa nem de condições de financiamentos dos bancos aos clientes na etapa de entrega das chaves de imóveis vendidos na planta. No entanto, a tendência é que o mercado fique mais apertado nos próximos meses, estimou. “Eu acredito que os bancos vão ter algum reajuste na taxa. Ainda não vimos nada disso, é uma opinião pessoal com base no cenário macroeconômico”, afirmou. Mickelberg acrescentou ainda que as vendas de imóveis da companhia e do mercado como um todo “seguem saudáveis”.
O diretor Financeiro e de Relações com Investidores da incorporadora Eztec, Emilio Fugazza, apontou um aumento na procura de financiamento pelos clientes diretamente com a incorporadora. Isso tem acontecido ainda de forma incipiente, mas indica que os bancos andam mais restritivos na concessão de empréstimos. “Os bancos têm buscado atender, mas nem todos os clientes se enquadram. Na média, a taxa de juros está mais alta”, afirmou.
Essa avaliação foi corroborada pela coordenadora de crédito da consultoria MelhorTaxa, Priscilla Basso. “Quanto às taxas, não tivemos mudanças. Mas vimos limitações na oferta dos recursos”, apontou a coordenadora da consultoria que presta serviço de comparação de taxas e condições de crédito.
O presidente da Abrainc, Luiz França, também espera dificuldades para o mercado. “A classe média tem interesse em comprar imóveis, mas encontra dificuldade em obter crédito devido aos juros elevado. Isso não só compromete o orçamento das famílias, que enfrentam obstáculos para financiar a casa própria, como também inibe o lançamento de novos projetos pelas incorporadoras, afetando todo o setor,” afirmou.
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