Agronegócios
12/06/2020 09:35

Boi: Dificuldade de rastrear toda a cadeia faz com que TAC da Carne na Amazônia precise de ajustes


Por Tânia Rabello e Ariosto Mesquita, especial para a Agência Estado

São Paulo e Campo Grande, 12/06/2020 - O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Carne e o Compromisso Público da Pecuária (CPP) na Amazônia estão em vigor há dez anos, mas algumas lacunas ainda impedem que o processo produtivo ateste 100% a garantia do não desmatamento. É o que mostra estudo da organização não governamental (ONG) Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, obtido com exclusividade pelo Broadcast Agro. Segundo o levantamento, o principal gargalo no Pará - Estado foco do estudo "TAC da Carne no Pará e Compromisso Público da Pecuária" - é a dificuldade de rastrear toda a cadeia produtiva de bovinos de corte para, assim, ter a certeza de que eles não foram criados em áreas desmatadas ilegalmente ou em fazendas que utilizam mão de obra análoga à escravidão, entre outras exigências sociais e ambientais do TAC da Carne e do CPP.

O diretor executivo da ONG Amigos da Terra, Mauro Armelin, conta ao Broadcast Agro que os frigoríficos que aderiram ao TAC da Carne (proposto pelo Ministério Público Federal) ou ao CPP (da ONG Greenpeace) conseguem rastrear muito bem animais da fase final da cadeia, ou seja, aqueles provenientes das fazendas que vendem o boi gordo, pronto para abate, o chamado "fornecedor direto". "Tanto que entre 2017, por exemplo, houve apenas 9,3% de um total de 2,08 milhões de animais abatidos com algum tipo de irregularidade", cita. "Em 2018, o número de animais subiu para 2,5 milhões e as irregularidades caíram para 4,7%." O monitoramento é feito por auditorias independentes contratadas pelas empresas de abate.

Armelin observa, entretanto, que o MPF mudou a metodologia de cálculo, o que pode ter contribuído para a queda mais acentuada. De todo modo, entre as empresas que aderiram ao TAC, a evolução na sistematização e no monitoramento de compras é clara tanto no cômputo geral quanto avaliando-se as indústrias separadamente. O Frigorífico Masterboi, por exemplo, que em 2017 apresentou 31% de irregularidades, em 2018 registrou 3,7%. A gigante JBS, por sua vez, apresentou 19,1% de irregularidades no TAC da Carne em 2017, em 2018, esse porcentual caiu para 8,3%.

O estudo aponta, então, que embora a venda direta seja rastreada de maneira satisfatória, o gargalo está no monitoramento das fases anteriores: "São aquelas fazendas que trabalham com cria e recria e são fornecedoras indiretas de animais, pois vendem para as propriedades que compram o boi magro para engordar e vender ao frigorífico", explica Armelin. "As fazendas que não fornecem o gado direto para o abate são as que carecem de maior fiscalização dentro do TAC da Carne ou do CPP."

Segundo o representante da ONG Amigos da Terra, que assina o estudo juntamente com Pedro Carvalho Burnier e Natália Tiso Grossi, há uma "triangulação" na venda de bovinos que acaba permitindo que aqueles criados em áreas não conformes sejam fornecidos para fazendas conformes. Estas, por sua vez, vendem para o frigorífico o boi "legalizado". Essa estratégia é possível justamente porque não há monitoramento mais consistente nas fases da cadeia produtiva anteriores à engorda.

Armelin diz que a Amigos da Terra tem interpelado os frigoríficos signatários do TAC ou do CPP a monitorarem a cadeia como um todo, e não só os fornecedores diretos. "Na época em que eles assinaram o TAC da Carne, há dez anos, a proposta era monitorar inicialmente os fornecedores diretos e depois a cadeia como um todo. Acho que já deu tempo de aprender como fazer isso e desenvolver tecnologias e metodologias para aferir se aqueles frigoríficos estão atendendo de fato os requisitos dos termos que eles mesmos assinaram, tanto do TAC quanto do CPP."

Outro gargalo apontado pelo estudo é o fato de que nem todos os frigoríficos do Pará aderiram ao TAC da Carne, proposto pelo Ministério Público Federal (MPF) do Estado em 2009. O levantamento da Amigos da Terra mostra que o Estado possui 45 plantas frigoríficas ou exportadoras de animais vivos, das quais 32 são signatárias do TAC da Carne - sendo que o estudo analisou dados dos 10 frigoríficos mais relevantes para o setor, com abates iguais ou superiores a 50 mil animais entre 2016 e 2018. Assim, 30% das indústrias que operam no Pará não seguem as regras propostas - o que não quer dizer que não tenham sistema próprio de monitoramento para evitar o desmatamento, caso da Marfrig.

De toda forma, o estudo observa que esses exemplos ilustram como é que empresas operando no mesmo território, porém com políticas de compras e compromissos de controle diferentes, podem comprometer o ambiente de negócios competitivo e justo, como o da compra de animais, e prejudicar os resultados do esforço do MPF para a redução do desmatamento no Estado do Pará.

Contato: tania.rabello@estadao.com
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