Economia & Mercados
17/10/2022 12:07

Fenasbac/Henriques: Laboratório do real digital dá mais sinais sobre desenho de CBDC brasileira


Por Thaís Barcellos

Brasília, 17/10/2022 - Com um mês de operação, o laboratório do real digital já começa a trazer mais indicações sobre o funcionamento da moeda digital do banco central (CBDC, na sigla em inglês), contou ao Broadcast Rodrigoh Henriques, diretor de Inovação da Federação Nacional de Servidores do Banco Central (Fenasbac), que coordena o laboratório com o BC. Além da manutenção da importância do sistema bancário na infraestrutura da moeda digital, com 'stablecoins' dos depósitos, há avanços em estudos sobre transações offline. Os trabalhos também indicam que, em breve, será necessário ouvir atores de fora do laboratório sobre o assunto, para dar mais consistência às propostas, como o Detran, por exemplo, avalia Henriques.

O Lift Challenge Real Digital foi lançado para executar projetos com casos de uso da futura CBDC brasileira. O início foi no dia 5 de setembro e está previsto para durar até 3 de fevereiro, com possível renovação por mais 60 dias, caso necessário. No segundo trimestre de 2023, o BC planeja que o público em geral tenha contato com os casos de uso considerados válidos pela primeira vez, com os chamados pilotos, que provavelmente serão testados com valores, grupos e regiões limitados.

Segundo o BC, as discussões realizadas no âmbito do laboratório estão sendo consideradas para desenhar a próxima fase de testes, com projetos piloto. "O desenho da fase de projetos piloto, incluindo a decisão sobre sua infraestrutura, será divulgado assim que concluído [o laboratório]", disse o órgão em nota.

Nove projetos foram escolhidos para o Lift Challenge, com variadas propostas: transações offline, facilitação de transferências internacionais e de troca de titularidade na compra de bens e ativos financeiros. Empréstimos por meio de plataformas de finanças descentralizadas e inovações para financiamentos rurais também estão no rol de propostas selecionadas.

"O laboratório é um microecossistema de finanças do futuro. Nesse sentido, os projetos começam a ter uma interação, com base em similaridades e complementaridades", diz Henriques, completando que as diferentes propostas dão a oportunidade de o BC observar os benefícios e desafios de cada, contribuindo para o desenho final do real digital.

Nesse sentido, alguns pontos já parecem mais claros. A primeira delas é a permissão que será dada aos bancos para emitirem tokens (representações digitais de um ativo em uma blockchain) dos seus depósitos, criando uma stablecoin (uma espécie de criptomoeda ligada a um ativo real, por isso menos volátil) do banco em questão.

Esse modelo, antecipado pelo Broadcast em dezembro e citado mais recentemente nas apresentações do presidente do BC, Roberto Campos Neto, permitiria o uso da moeda digital para pagamentos inteligentes, sem precisar fazer a troca para o real digital - que não ficaria nas contas depósitos dos bancos, apenas sob sua custódia.

"Tem uma grande vantagem em relação a uma CBDC raiz, vindo direto do BC, já existe regulação para depósitos, e manteria a alavancagem financeira de banco comercial, o que limita muito o risco de narrow banking, de restringir as atividades bancárias e de quebrar a estrutura bancária tradicional."

Com isso, deve ser necessária a criação de uma nova camada controlada pelo BC pela qual passariam todas as transações, como já ocorre no Sistema de Transferência de Reservas (STR), para a moeda "tradicional", e no Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI), para o caso de operações com o Pix.

Outro desenvolvimento que parece certo é a importância de criar maneiras de garantir que a população continue conseguindo transferir recursos de forma offline com a CBDC. Henriques explica que o mais provável é que o cliente tenha que pôr uma determinada quantia em um saldo separado da sua conta para acessá-la em momentos em que precise fazer uma transferência, mas que não haja conexão com a internet. "Mais ou menos do mesmo jeito que saímos hoje, com dinheiro na carteira."

A conexão poderia ser estabelecida com dois celulares, ou com um celular e um cartão ou ainda com um cartão e uma maquininha, por meio de tecnologias como aproximação e bluetooth. Mas as dificuldades tecnológicas, de inclusão e de segurança para colocar esse projeto de pé, contudo, são muitas. "Não se achou a solução ainda, mas é uma prioridade garantir. Não sabemos se vamos conseguir isso rápido."

Impacto na vida das pessoas

Segundo o diretor de Inovação da Fenasbac, o foco no laboratório é a tradução do impacto dos projetos na vida das pessoas. "Quando falamos de casos de uso, no fundo estamos falando em como vai impactar a vida da dona de casa, da dona da farmácia e da dona da indústria."

Como exemplo, Henriques cita o projeto do Itaú Unibanco, que prevê a transferência de moeda digital do Brasil para a Colômbia, onde o banco tem uma subsidiária, com a operação de câmbio mais rápida e barata. “Mas estamos falando de uma transferência de R$ 200 ou de R$ 200 milhões? Se custar R$ 200 para remeter R$ 200, não vale a pena."

Embora muitas criptomoedas tenham resolvido esse problema, Henriques lembra que o custo irrisório só é possível devido ao anonimato, pois não se procura saber quem está por trás das operações. Mas um Estado não pode fazer uma moeda 100% anônima.

Henriques ainda afirma que os trabalhos no laboratório mostram que, em breve, órgãos fora do sistema financeiro, como o Detran, terão de ser ouvidos para viabilizar, por exemplo, contratos inteligentes na aquisição de veículos. O projeto do Santander no laboratório propõe a conversão para o formato digital (tokenização) do direito de propriedade de veículos e imóveis. Dessa forma, com o método de pagamento versus entrega, o pagamento pelo bem ocorreria no mesmo instante que o título de propriedade é transferido para o comprador.

"Para qualquer tipo de transferência de bem, o atual responsável por essa titularidade tem que estar no projeto, de preferência agora. É preciso entender como o Detran está tratando de blockchain, titularidade de blockchain e emissão de token", diz, completando que o mesmo vale para os cartórios, por exemplo.

Contato: thais.barcellos@estadao.com
Para ver esta notícia sem o delay assine o Broadcast+ e veja todos os conteúdos em tempo real.

Copyright © 2024 - Todos os direitos reservados para o Grupo Estado.

As notícias e cotações deste site possuem delay de 15 minutos.
Termos de uso