Economia & Mercados
16/03/2022 13:55

Especial: Mercado de benefícios atrai novas empresas e deve ter onda de inovações


Por Gabriel Baldocchi

São Paulo, 16/03/2022 - A combinação de mudanças regulatórias para ampliar a concorrência e os novos hábitos dos trabalhadores e empresas na pandemia chacoalhou o mercado de benefícios corporativos e despertou o interesse de novas entrantes no segmento. O aumento no número de concorrentes deve se acelerar nos próximos meses e trazer junto uma onda de inovações e de novos produtos que vão muito além do tradicional vale-alimentação.

Mercado Pago, iFood e estrangeiras como a Swile são alguns dos nomes mais recentes a despertar para as oportunidades do segmento. O Brasil é o maior mercado de benefícios, com cobertura de cerca de 23 milhões de trabalhadores e um giro estimado em mais de R$ 100 bilhões. O País chegou ao posto puxado pelo Programa de Alimentação ao Trabalhador (PAT), criado em 1976, e a incorporação cultural da modalidade, muito comum em negociações sindicais e ofertas de empregos, por exemplo.

Até agora, porém, o segmento vinha sendo dominado por poucas empresas e havia barreiras de entradas relevantes, como a necessidade de formação de uma rede de estabelecimentos credenciados. A reforma trabalhista abriu a porta para mudar esse quadro ao estabelecer regras mais claras para as ofertas dos vales e a forma de tributá-los.

Um decreto publicado no fim do ano passado sedimentou a abertura do mercado ao estabelecer regras pró-competitivas, como a proibição da prática de rebate, em que parte dos recursos envolvidos nos benefícios remuneravam as áreas de recursos humanos pelas escolhas das empresas fornecedoras dos vales.

"O mercado de benefícios ainda é um oligopólio", afirma Tulio Oliveira, vice-presidente do Mercado Pago. "Era um mercado dominado por grandes empresas e só neste último ano já vimos a entrada de alguns novos nomes. Acho que teremos um ambiente muito mais competitivo do que há hoje."

O Mercado Pago decidiu entrar no segmento de olho nas novas regras e já se lançou com um produto novo. Todos os vales são concentrados em um só cartão, que também funciona como débito e crédito. A meta é crescer com a solução na base de clientes do grupo. A estratégia envolve uma atuação para além das grandes capitais e abrange principalmente empresas menores no início, um universo de cerca de 20 milhões de negócios.

Pequenas e médias empresas em geral não conseguem usufruir do benefício fiscal principal do Programa de Alimentação ao Trabalhador, válido apenas para quem está enquadrado na regra de lucro presumido. Mas o Mercado Pago quer avançar também entre esse último grupo, visto como o filé mignon do segmento pelo benefício tributário vantajoso - um dos motivos que ajudam a explicar o desenvolvimento do segmento no Brasil.

Dados do programa já vêm mostrando o avanço da competição. A fatia das empresas menores que atuam dentro do PAT - número que abarca as novas entrantes - subiu de 3% em 2019 para 16% no ano passado.

"Tivemos uma entrada razoável de empresas que até um tempo atrás não tinha no setor", afirma Jessica Srour, diretora-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT). "Por conta dessas mudanças regulatórias é que outras empresas têm sido atraídas para esse setor." Para ela, o movimento deve se intensificar.

Candidatas

O perfil de potenciais interessadas inclui um conjunto de empresas capaz de adquirir escala e com algum tipo de relacionamento com negócios e trabalhadores.

Além dos grupos novos que já ingressaram, nomes de prováveis candidatas circulam no mercado, como o do Magazine Luiza. Segundo apurou o Broadcast, embora não tenha planos para entrar no segmento no momento, o grupo não descarta uma investida no futuro. Para tomar uma decisão, basta que olhem para dentro de casa. A Hub, fintech adquirida pela Magalu, já tem tecnologia para oferecer a solução.

Para o iFood, a decisão de entrar no segmento também surgiu da própria plataforma de entregas. O grupo percebeu uma dependência dos restaurantes e das empresas de vale para definir quais estabelecimentos dentro da plataforma aceitariam ou não o benefício. Decidiu então criar a sua própria solução para cadastrar todo mundo que estivesse disponível no sistema.

Hoje, o iFood Benefícios oferece solução para empresas e trabalhadores no Brasil e no exterior, num modelo que tem o foco na tecnologia. A cobertura já alcançou 600 mil colaboradores e a expectativa é alcançar 1 milhão em breve.

"Quando veio a pandemia, vimos uma antecipação de tendência de uma nova realidade de trabalho e uma nova demanda por soluções de benefícios", afirma Paula Rabelo, diretora de growth do iFood Benefícios. "Já que somos uma empresa digital, por que não criar uma solução com tecnologia?"

Para a executiva, a entrada de novas empresas vai forçar as companhias do setor a se desafiarem. "A abertura do mercado vai favorecer mais interessadas em ingressar. Quanto mais competitivo, melhor."

Estrangeiras

A onda de novos atores inclui também companhias do próprio setor. A francesa Swile viu surgir uma oportunidade com as mudanças promovidas pelo avanço da regulamentação e decidiu entrar no País por meio da fusão com a brasileira Vee, no ano passado.

A empresa atua tanto por meio do PAT como no arranjo fora dele, com outras opções além do vale-alimentação. O grupo foca numa oferta de benefícios flexíveis para que o trabalhador e a empresa possam escolher como distribuir a cesta de seus auxílios, de livros à mobilidade.

Segundo Júlio Brito, gerente geral da Swile no Brasil, havia uma demanda por flexibilidade de benefícios por parte das áreas de Recursos Humanos, e o modelo se tornou possível com as mudanças na legislação. "Queremos dar liberdade ao trabalhador, levar o produto que proporciona a melhor experiência", afirma Brito. "Às vezes querem fazer uma migração do alimentação para mobilidade e não podem."

A francesa já conta 100 mil clientes no País e espera quadruplicar esse número até o fim do ano. Também planeja lançar dois novos produtos no Brasil: um sistema de cashback e uma ferramenta para melhorar o engajamento de trabalhadores em empresas.

Novos produtos

A onda de novos entrantes vai ajudar a acelerar a inovação no segmento e incrementar a forma como trabalhadores e empresas lidam com os vales, desde a oferta de coberturas para novas modalidades até a forma de processá-los e usá-los.

A evolução das categorias é até difícil de antever no meio de tantas mudanças pelas quais as relações de trabalho estão passando. Alguns novos caminhos já começam ser testados, como benefícios voltados para o mercado pet e uma gama cada vez mais ampla na área de bem-estar e fitness.

Na Europa, por exemplo, já há empresas que distribuem o ecovoucher, para permitir que funcionários usem o benefício em produtos vistos como sustentáveis. Para o mercado, é uma questão de tempo e adaptação até que algo semelhante chegue por aqui.

"Tem uma série de produtos que vão melhorar e novas verticais (segmentos) vão se abrir", afirma Oliveira, do Mercado Pago. "Começam a aparecer novos setores, é um mundo de oportunidades."

Contato: gabriel.baldocchi@estadao.com
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