Economia & Mercados
02/12/2020 09:06

Especial: Compromissadas do BC caem com falta de vencimentos e migração para títulos do Tesouro


Por Denise Abarca e Renata Pedini

São Paulo, 01/12/2020 - O estoque de operações compromissadas do Banco Central, utilizadas na gestão de liquidez do sistema financeiro, diminuiu em pelo menos R$ 150 bilhões em novembro, considerando apenas os recursos enxugados nas operações de um dia (overnight). Nas chamadas compromissadas semanais, para dois e três meses, também foram observados volumes bem menores ao longo do mês. A redução do estoque coincide com a ausência de vencimentos de títulos da dívida pública, que costumam manter o sistema irrigado, segundo alguns profissionais ouvidos pelo Broadcast, enquanto outros veem migração de recursos para os leilões do Tesouro. Porém, o quadro deve ser temporário, pois há uma expectativa de que o estoque volte a aumentar no começo de 2021.

A redução das compromissadas ocorre após um salto visto no overnight, reflexo de um limite imposto pelo BC na rolagem da compromissada de 45 dias (do Copom), de R$ 600 bilhões, válido desde 29 de outubro. Desde então até meados de novembro, o giro no over saltou para a casa dos R$ 700 bilhões, mas nos últimos dez dias vem arrefecendo de volta à faixa dos R$ 500 bilhões.

O mercado esperava que os recursos fossem absorvidos pelo Tesouro. "A limitação a R$ 600 bilhões na 'compromissada Copom' por parte do BC parece que funcionou para dar um chacoalhão no mercado: para que ficar aplicando em compromissada se o Tesouro paga mais?", afirma o gestor de renda fixa da MZK Investimentos, Danilo Macari, destacando que desde o começo de outubro o Tesouro emitiu mais de R$ 300 bilhões. O gráfico abaixo mostra que, após encerrar outubro em R$ 1,6 trilhão, o estoque das compromissadas até 26 de novembro já se aproximava dos R$ 1,4 trilhão.

"Quando olhamos para os resultados das compromissadas, todas estão muito próximas à Selic over. Comparado com os prêmios nas LTNs casadas e nas LFTs, não tem por que empatar o caixa nas compromissadas", diz Macari. Ele destaca que a LTN mais curta paga algo próximo a 5 pontos-base acima da taxa do Contrato de Depósito Interbancário (CDI). "Se você optar por alongar um pouco, recebe 10 pontos. E se optar por mais longa, chega a quase 30 pontos", explica, acrescentando que as Letras Financeiras do Tesouro (LFT) "seguem o mesmo raciocínio".


Fonte: MZK Investimentos

Sérgio Goldenstein, ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do Banco Central e consultor independente da Ohmresearch, pondera que a redução do estoque de compromissadas está relacionada à sazonalidade. "Em novembro e dezembro não tem vencimento de títulos. Tudo o que o Tesouro coloca reduz o estoque", resume. "Os vencimentos de prefixados ocorrem a cada cabeça de trimestre: janeiro, abril, julho e outubro. Quando tem vencimentos, os estoques sobem", completa. Ele prevê que as compromissadas voltem a subir no próximo mês, considerando a injeção de R$ 104 bilhões (conforme o cronograma oficial) no sistema com vencimentos de Letras Financeiras do Tesouro (LTN) e Notas do Tesouro Nacional - série F (NTN-F) no primeiro dia de 2021.

O estrategista de renda fixa da Renascença DTVM, Fernando Cevi Ferez, vai na mesma linha. "Estamos falando de um período, os últimos dois meses do ano, em que sazonalmente há uma redução das compromissadas porque não há nenhum tipo de evento que faça entrar dinheiro no mercado", afirma. Sem pagamento de cupom nem vencimento de papel, dia a dia o volume das compromissadas vai cair até o fim do ano, projeta.

Macari, da MZK, tem outra visão. "A liquidez existe e está aí nas compromissadas que somam 25% da dívida na mão do mercado." Segundo ele, o Tesouro tem o cuidado de, no longo prazo, não colocar vencimentos nos últimos meses do ano por conta dos já normalmente grandes vencimentos programados todos os janeiros.

Fatores contracionistas do excesso de liquidez bancária, que levariam a uma redução das compromissadas do BC, seriam a emissão líquida de títulos pelo Tesouro, a venda de reservas cambiais, o aumento de depósitos compulsórios e a obtenção de superávits fiscais, diz Goldenstein. "Como os dois últimos estão descartados e a venda de reservas, se acontecer, não deve ser em volume elevado, o estoque de compromissadas deve permanecer alto, até porque uma eventual emissão líquida do Tesouro serviria para refinanciar a dívida e financiar o déficit fiscal, com efeito total próximo ao neutro sobre a liquidez bancária."

O diretor do ASA Investments e ex-secretário do Tesouro, Carlos Kawall, acredita estar havendo, sim, deslocamento da liquidez das compromissadas para os leilões e os sinais de normalização no mercado secundário de LFTs ilustram isso. "O mercado está mais tranquilo, com o prêmio da LFT estabilizado na casa dos 35 pontos há alguns dias", afirma. Na última quinta-feira, o Tesouro conseguiu, pela primeira vez em meses, vender integralmente uma oferta de LFT no leilão, de até 500 mil títulos.


Fonte: ASA Investments

Kawall ressalta que o próprio diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra, destacou a relação entre as compromissadas e os leilões, em live no último dia 11. Naquela ocasião, Serra afirmou que "dos R$ 400 bilhões que o BC não aceitou nas compromissadas de 45 dias, por volta de R$ 260 bilhões migraram justamente para títulos públicos", lembrando que estes estão pagando mais prêmios e, por isso, é normal que os papéis sejam mais atrativos que as compromissadas. Serra apontou ainda que nem LTNs nem LFTs estão mais no pico registrado no início de outubro. "A reação do investidor foi muito positiva. Estamos vendo uma desaceleração da fuga de fundos", acrescentou.

Goldenstein, porém, alerta sobre a subida gradual do deságios da LFT e risco de retorno da pressão no mercado secundário. "É muito arriscado sancionar deságio crescente. O Tesouro não devia sancionar", arremata, pontuando que os leilões têm sido "pequenos", pela baixa demanda diante da perspectiva de carregar o papel com juro real negativo pela Selic na mínima histórica.

Contatos: denise.abarca@estadao.com e renata.pedini@estadao.com
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