Economia & Mercados
20/08/2020 09:04

Especial: Com privatizações mais longe, Eletrobras e Sabesp perdem R$ 13,6 bi em agosto


Por Matheus Piovesana

São Paulo, 19/08/2020 - A declaração dada pelo governador de São Paulo, João Doria, de que a Sabesp voltará a um processo de capitalização coroou um mês em que as teses de privatização têm sido deixadas de lado na B3. Com a pandemia, as eleições municipais e o cenário político incerto, em especial em Brasília, o mercado arrefeceu suas apostas em investimentos que dependem de desestatizações, o que além da empresa paulista, inclui a Eletrobras. Juntas, as duas figuram entre as maiores quedas do Ibovespa em agosto, e perdem R$ 13,6 bilhões em valor de mercado.

O principal motivo para o "desânimo" é a percepção de que os processos, naturalmente demorados, levarão ainda mais tempo para se concretizar agora, com os respectivos controladores das empresas mais preocupados com as questões relacionadas à pandemia da covid-19 e ao pleito de outubro. "Era difícil pensar que isso aconteceria em 2020. Nós sabemos que esses eventos não são lineares", afirmou Jorge Junqueira, sócio da Gauss Capital.

Diferentes fatores levaram o mercado a incluir em seus modelos a possibilidade de privatizações rápidas. Para a Sabesp, além da reiteração por parte de Doria e do secretário da Fazenda de São Paulo, Henrique Meirelles, de que a empresa poderia ser vendida, o novo marco legal do saneamento básico, aprovado em junho e que facilita a venda das estatais do setor, era aguardado com expectativa.

Já a Eletrobras tem um projeto de lei que cria os parâmetros para a venda esperando por análise no Legislativo em Brasília desde novembro. Em paralelo, as declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, e da cúpula da empresa criaram em parte do mercado a impressão de que haveria um esforço político para que a venda saísse a curto ou médio prazo.

As movimentações políticas mais recentes, porém, reverteram as expectativas sobre ambas. Para a Sabesp, a falta de um posicionamento firme sobre o processo após o marco do saneamento gerou desconfiança. A primeira manifestação, que foi a de hoje cedo, não agradou. "Desde que o Doria assumiu, ele fala que vai privatizar, que dependia do marco regulatório para isso. Mas se capitalizar, ela continua estatal e fica como está", disse Vitor Sousa, analista do Brasil Plural.

Para a Eletrobras, o pedido de demissão do então secretário de privatização do Ministério da Economia, Salim Mattar, que se disse insatisfeito com o andamento da agenda de privatizações, acendeu a luz amarela. O Itaú BBA viu no evento um "forte revés" a uma venda que ainda tem uma longa negociação à frente no Congresso. "Acreditamos que será necessário fazer algumas mudanças para ganhar maior suporte político", comentaram os analistas Marcelo Sá, Fernando Zorzi e Luiza Candiota.

O resultado é que em agosto, as ações com direito a voto das duas empresas têm queda de 13% cada uma, contra baixa de 1% do Ibovespa no mesmo período. "O ponto é que o mercado está começando a ver que as privatizações vão demorar mais do que se previa", diz Gustavo Almeida, analista de ações da Spiti. "Esse ágio que havia nas ações por causa da privatização está sumindo."

Até a tarde de hoje, esse "ágio" significava uma perda de valor de mercado de R$ 8,3 bilhões para a Eletrobras, e de R$ 5,3 bilhões para a Sabesp.

Nada é definitivo

Em ambos os casos, porém, analistas afirmam que o problema é a pressa: as vendas devem sair, o improvável é que maiores progressos aconteçam neste ano, o que expõe os dois processos ao risco eleitoral agora e em 2022. "Ainda temos dois anos até as eleições (para governador), mas a cada mudança de governo há uma mudança de mentalidade, e caímos nesse tipo de risco", apontou Junqueira, da Gauss, ao comentar o caso da Sabesp.

Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos, considerou que a leitura de que a fala de Doria afastou a Sabesp da privatização é precipitada. "Talvez o mercado esperasse uma posição mais afirmativa, um passo mais sólido rumo à privatização definitiva. Mas não vejo essa etapa como ruim. Com toda essa complicação política, é impensável que alguém se mexa para uma venda agora."

Neste sentido, contra o posicionamento público do ministro da Economia ou mesmo do governador, jogam as necessidades políticas. "Seria ótimo se a privatização fosse agora, mas sabemos que não é um processo suave", comentou Junqueira, da Gauss. Ele lembra que mesmo privatizações bem sucedidas levaram algum tempo para sair. A Vale, por exemplo, foi incluída no Plano Nacional de Desestatização (PND) em julho de 1995, mas só viria a ser vendida de fato quase dois anos depois, em maio de 1997.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com
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