Economia & Mercados
22/02/2022 11:05

Entrevista/Stone/Thiago Piau: Empresa definitivamente não está à venda


Por Matheus Piovesana e Altamiro Silva Junior

São Paulo, 21/02/2022 - A credenciadora Stone "definitivamente" não está à venda, afirma o presidente da companhia, Thiago Piau, em entrevista por escrito ao Broadcast. Por outro lado, ele admite que a empresa pode avaliar eventuais parcerias na registradora Tag, como antecipou a Coluna do Broadcast na semana passada.

Para 2022, a prioridade da Stone é lançar um novo produto de crédito "o mais rápido possível", cercado de garantias, e virar a página do período mais conturbado de sua história.

No ano passado, a Stone apostou na concessão do chamado crédito fumaça, que tem como garantia recebíveis futuros, para dar um salto de rentabilidade e tamanho. A companhia esperava alavancar o produto com o registro de recebíveis, mas as falhas do sistema e a fuga das garantias viraram a maré.

Em meio a uma onda de calotes, a empresa parou as concessões, e, diante disso, despencou na Bolsa. Hoje, vale R$ 17,2 bilhões na Nasdaq, ante R$ 134 bilhões no começo de 2021.

Por outro lado, assim como as rivais, a empresa também teve de lidar com a rápida alta da Selic, muito mais veloz que os reajustes dos preços cobrados dos clientes. Como consequência, as margens caíram. "Há um processo natural de repasse do aumento da Selic para os clientes que recomporá as margens", diz Piau.

Com os reajustes, o novo produto de crédito e a simplificação da gestão, a Stone quer reconquistar a confiança perdida. O balanço da empresa no quarto trimestre de 2021 deve sair em março.

Confira os principais trechos da entrevista:

Broadcast: Tem havido crescentes rumores de que a Stone teria contratado um banco e um escritório de advocacia para avaliar opções estratégicas. A empresa está à venda?

Thiago Piau:
Definitivamente a informação não procede. O banco mencionado nesses rumores (o JPMorgan) é nosso parceiro de longa data e nos assessora em diversas transações, e o escritório de advogados (Galdino & Coelho) trabalha em uma causa específica de um cliente, sem qualquer relação com o que foi ventilado.

Broadcast: Qual foi o erro da Stone na concessão de crédito?

Piau:
O principal fator de risco que considerávamos ao conceder crédito era o da materialização das garantias oferecidas pelos clientes - no caso, os recebíveis das vendas futuras de cartão. A pandemia e as medidas de distanciamento pressionaram os negócios dos lojistas, que passaram a buscar formas de não honrar seus empréstimos, promovendo a fuga dessas garantias. Além disso, o sistema de registro de recebíveis apresentou inúmeras falhas que permitiram essa fuga de garantias. Decidimos, então, paralisar a operação de crédito em julho e refazer o produto.

Broadcast: Qual será o novo desenho do produto? A empresa será mais seletiva? Quais garantias exigirá?

Piau:
Retomaremos o crédito em breve. Complementaremos os recebíveis de cartão com outras formas de garantia que o lojista e seus sócios possam oferecer. Além disso, com as mais de 100 mil operações que fizemos, aprendemos a distinguir melhor bons de maus pagadores. A velocidade com a qual escalaremos o produto também será outra: avançaremos de forma mais gradual.

Broadcast: Desde o pico, no começo do ano passado, a ação da Stone cai cerca de 85%. Como recuperar a confiança do mercado?

Piau:
Temos trabalhado em três frentes principais: ajuste dos preços da Stone e do Ton (maquininha para microempreendedores) para restabelecer a rentabilidade, trabalhamos para que possamos voltar a oferecer o produto de crédito o mais rápido possível e simplificando a forma como gerimos o negócio. Esperamos que a última frente ajude os investidores na interpretação do negócio e da direção para a qual estamos apontando.

Broadcast: O mercado está subavaliando a Stone?

Piau:
Há um fator exógeno à companhia - o aumento da taxa de juros, que afeta o valor de mercado de todos os ativos da economia. O efeito do aumento da taxa de juros é maior para o valuation de empresas de crescimento, cujos fluxos de caixa se materializarão no futuro, como é o caso da Stone. Como não controlamos a taxa de juros, priorizamos o que está sob nosso controle. Assim, temos feito um esforço para restabelecer a rentabilidade por meio de ajustes de preço, colocar o produto de crédito de pé e simplificar nossa gestão.

Broadcast: A Stone reconheceu no trimestre passado que a Linx ainda gera resultados negativos. Qual é o horizonte de tempo para que essa contribuição seja positiva?

Piau:
O negócio de software tem margens menores que o de serviços financeiros. Isso impactou o nível de despesas da Stone na visão consolidada a partir do terceiro trimestre de 2021. Por outro lado, é um negócio que nos permitirá conhecer de maneira mais profunda a vida do lojista, gerando informações que vão ser muito úteis para a concessão de crédito. Não menos importante, é um negócio no qual o nível de retenção do cliente é bastante alto, o que beneficiará os serviços de pagamento que ofertamos.

Broadcast: A integração da Linx atrasou? Qual foi o empecilho?

Piau:
Apesar de a transação ter ocorrido em 2020, a autorização pelo Cade só ocorreu em julho de 2021. Foi só aí que pudemos ter acesso à empresa. No segundo semestre de 2021, concluímos a migração da LinxPay para a Stone. Agora, nosso foco tem sido gerar ganhos de eficiência operacional na Linx e iniciar o projeto de uma plataforma única entre as empresas.

Broadcast: A alta na taxa Selic é vista como um problema para o setor de adquirência, que tem se tornado mais competitivo. A Stone teme perder margens?

Piau:
Não. Há um processo natural de repasse do aumento da Selic para os clientes que recomporá as margens.

Broadcast: A empresa tem conseguido reajustar os preços cobrados de seus clientes?

Piau:
Uma nova política de preços já começou a ser implementada gradualmente em novembro e já está contribuindo para margens melhores.

Broadcast: No registro de recebíveis, analistas argumentam ser preciso combater a fuga de garantias, e que há brechas na regulação atual. O fenômeno prejudicou a Stone de algum modo? A empresa ainda vê um problema latente?

Piau:
O problema de fuga de garantias não é regulatório: as regras estão bem desenhadas. O problema está na operacionalização das regras e da regulação, que são boas. A indústria espera que esse problema se resolva ainda neste semestre.

Broadcast: O registro de recebíveis tem funcionado a contento?

Piau:
Ainda não. Nesses oito meses, houve avanços em relação à entrada do sistema em junho de 2021, que foi conturbada. No entanto, o sistema ainda não funciona plenamente. O problema de fuga de garantias é um exemplo. A despeito dos problemas, queria enfatizar que registro de recebíveis é algo muito importante: ao funcionar de maneira eficaz, aumenta muito a segurança de quem concede crédito. Além disso, o sistema se desenvolverá para outros ativos além de recebíveis de cartão de crédito, como será o caso da duplicata. Vislumbro que ativos digitais também serão abarcados num futuro próximo.

Broadcast: Se concretizada, a desaceleração da economia brasileira neste ano pode reduzir o crescimento da Stone?

Piau:
Mesmo num cenário de desaceleração, as oportunidades na oferta de serviços financeiros por meio de tecnologia são numerosas. Um exemplo: tivemos, no biênio 2015-2016, a maior recessão da história e o setor de pagamentos cresceu enormemente. A digitalização fará com que as pessoas substituam o dinheiro por meios de pagamentos eletrônicos, o que torna o setor resiliente às pioras do ciclo econômico. Por sua vez, a oportunidade do crédito é enorme: por volta de 70% da modalidade de crédito de capital concedido a PJ é feito pelos cinco maiores bancos. Há ainda o enorme pool dos varejistas que não conseguem crédito. Para resolver essa oportunidade, estamos reconstruindo nosso produto para voltar a oferecer capital de giro para os clientes.

Broadcast: A Tag tem apresentado o desempenho que a Stone esperava dela? A empresa está à venda?

Piau:
A Tag é um investimento que afirma nosso compromisso com o sistema de registro e a visão sobre a qual tratamos na pergunta anterior: de que é possível aumentar a capacidade de colaterização da economia e, assim, expandir e baratear o crédito. A empresa está operacional há oito meses - desde junho de 2021, quando a regulação entrou em vigor -, e temos visto relevante evolução nos últimos meses. A Tag não está à venda. Não sendo nosso core business, poderemos avaliar eventuais parcerias no futuro, se fizerem sentido estrategicamente.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com e altamiro.junior@estadao.com
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