Economia & Mercados
22/05/2024 11:54

Entrevista/Décio Oddone:Nova petroleira chega à B3 em agosto para crescer e gerar dividendos


Por Mônica Ciarelli, Denise Luna e Gabriel Vasconcelos

Rio, 21/05/2024 - Ainda sem um novo nome, mas com um CEO bem conhecido no setor, a petroleira fruto da fusão entre Enauta e 3R chega à B3 em agosto. Em entrevista ao Broadcast, o veterano Décio Oddone, escolhido para comandar a companhia combinada, revela que ela nasce mais robusta e com potencial de distribuir dividendos, algo raro entre as chamadas "junior oils" brasileiras.


Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Após concretizar a fusão, diz Oddone, a prioridade será traçar um planejamento para os próximos cinco anos e entregar resultados, com destaque para um crescimento contínuo da produção. Mas a consolidação do setor continua no radar. O executivo não descarta possíveis acordos operacionais com a PetroRecôncavo, antiga namorada da 3R, e que, sem saber, abriu caminho para que a Enauta enxergasse a oportunidade de se aproximar da concorrente. "Ali a gente viu que eles estavam abertos a uma transação", disse Oddone. Veja a seguir a entrevista feita após o anúncio da combinação dos ativos das duas companhias:

Broadcast: Por que o senhor foi escolhido como presidente da nova empresa?
Décio Oddone : Essa foi a escolha feita e a gente está satisfeito com ela (risos). A prioridade absoluta é entregar os resultados dessa nova companhia. Temos um conjunto de ativos importantes, Atlanta, Potiguar, Papa-terra e outros. Nossa prioridade é fazer com que esses ativos consigam entregar os melhores resultados possíveis. Isso passa por fazer a integração adequada da companhia, motivar o pessoal e fazer um planejamento de longo prazo coerente, que permita continuar crescendo. Mas a prioridade ainda é entregar, porque sem entrega não tem reconhecimento.

Broadcast: Como fica a nova empresa?
Oddone: A gente avançou, na semana passada, na aprovação pelos conselhos de administração da Enauta e da 3R da combinação dos negócios das duas companhias. Feito isso, agora tem passos formais que precisam ser atendidos. O que define se a operação vai acontecer ou não é a aprovação do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), e a aprovação dos conselhos de administração das duas empresas.

Broadcast: O pedido já está no Cade ?
Oddone: Já foi para o Cade. As assembleias vão ser dia 17 de junho, e a gente tem um passo adicional. Como as ações da Enauta não constam no Ibovespa, nossos acionistas têm direito a recesso. Isso quer dizer que eles podem não aderir à transação e trocar as ações pelo valor patrimonial delas, um pouquinho mais de R$ 14 (por ação). Então, esse processo tem que ser feito e leva um mês a transação. Além dos prazos do Cade e dos acionistas, ainda foram aprovados esses 30 dias de direito de recesso.

Broadcast: Nesses 30 dias, o acionista vai poder mexer na ação?
Oddone: Quem quiser tem o direito de receber o valor patrimonial da ação. Mas o valor da ação está muito acima desse valor patrimonial. Não tem previsão de lock-up (travar venda de ações) hoje.

Broadcast: Para quando está prevista a chegada da nova empresa na bolsa?
Oddone: A operação deve acontecer no final de julho ou início de agosto. Então nesse início de agosto a nova empresa deve chegar na bolsa. Na verdade não chega, ela já está na bolsa. Hoje as duas estão na bolsa, mas quando a operação se concretizar, a Enauta deixa de ser listada e só segue a 3R listada.

Broadcast: E o nome, como vai ficar?
Oddone: A gente não sabe ainda, vamos fazer uma análise. Vamos avaliar, mas possivelmente vai ser decisão dos acionistas, dos nossos conselheiros. Vamos ver qual a melhor marca, tanto isso quanto à questão do lock-up são decisões dos acionistas.

Broadcast: Qual será a cara da nova empresa?
Oddone: Ela nasce uma companhia bem mais robusta do que do que as duas isoladas, como colocamos na proposta original, naquela carta aberta de abril. Vai ser uma companhia com o portfólio mais diversificado, que se complementa. Mais robusta do ponto de vista de resiliência a ciclos de petróleo, com crescimento contínuo de produção pelos próximos anos. Isso porque o perfil de produção dos projetos que as companhias têm são complementares no tempo. Então, quando se combinam os portfólios da Enauta e da 3R, contando com onshore e offshore, a gente cria uma companhia em que o crescimento de produção é contínuo.

Broadcast: Essa nova empresa tem como proposta ser pagadora de dividendos?
Oddone: Essa é uma companhia que tem sim potencial para crescer e pagar dividendo. O ideal é ter uma combinação de crescimento com algum dividendo. Na minha leitura, o dividendo não pode ser alto o bastante a ponto de comprometer o crescimento. E o crescimento não pode e não deve ser o único objetivo, porque aí você não atrai o acionista que precisa de algum dividendo. Então é um desafio. Essa é a visão que eu tenho, mas isso vai estar sujeito à determinação do novo Conselho de Administração.

Broadcast: E a gente pode pensar em mais uma empresa chegando nessa fusão?
Oddone: Sempre. Lá na frente, compra de ativos, continuação da consolidação está no radar, mas não é prioridade. Agora é entregar os resultados dos ativos que a gente tem.

Broadcast: E qual vai ser a primeira ação de vocês após a fusão?
Oddone: A primeira coisa que a gente vai ter que fazer quando tiver a empresa combinada é sentar e fazer um novo planejamento de cinco anos. Aí vamos conseguir vislumbrar melhor. Devemos fechar isso até o fim do ano.

Broadcast: O que a gente pode esperar para o gás a partir da fusão?
Oddone: Aumenta a produção da companhia, aumentam as possibilidades de se fazer negócios na área de gás porque a gente tem produção de gás na Bahia, no Rio Grande do Norte, tem Peroá/Cangoá no Espírito Santo. Dentro desse planejamento que eu coloquei, vamos pensar qual é a melhor maneira de gerenciar os ativos de gás da companhia. Abre muito o leque. A gente passa a ser um dos maiores produtores de gás não associado do Brasil. Dá flexibilidade grande para pensar em fazer negócios de gás que gerem mais valor.

Broadcast: Qual é a vantagem disso? Podem avançar na cadeia, ir para geração de energia?
Oddone: Não foi pensado ainda, mas eu não descartaria não. Vai ter que ser feita uma análise, um estudo. Esse planejamento que a gente vai fazer, seguramente, vai contemplar isso. Manati é na Bahia e tem gás não associado. Peroá/Cangoá, no Espírito Santo, também não é associado. Uruguá e Tambaú trazem gás para o Sudeste. A 3R também tem produção relevante de gás no Nordeste. Então a gente vai fazer uma combinação desses ativos e tentar identificar quais são as melhores maneiras de extrair valor dessa combinação de ativos.

Broadcast: Tivemos no Brasil a época dos leilões, das vendas da Petrobras, e agora a gente tem a consolidação e a criação de empresas mais fortes?
Oddone: Para quem me ouve há muito tempo, isso não é novidade. Eu sempre falei e a gente sempre pensou nisso. Só que as condições não estavam dadas para que esse movimento acontecesse.

Broadcast: O que mudou para a fusão acontecer?
Oddone: Mudou a configuração societária. Tinha uma composição societária em que parte das ações estava em garantia para bancos. Então era uma restrição para que se pudesse avançar rapidamente nesse tipo de transação. A gente, ao se aproximar da entrega do sistema definitivo de Atlanta, ficou mais preparado para isso. Do lado da 3R, em janeiro, a Maha fez uma proposta de transação da 3R com a PetroRecôncavo, e isso abriu as discussões sobre a consolidação do setor. A gente achou que a combinação nossa com a 3R, algo que a gente já pensava, era mais interessante do que as outras opções de negócios disponíveis. Tanto foi assim, que o próprio Conselho de Administração da 3R concordou com a proposta de consolidação, de combinação de negócio.

Broadcast: O senhor conversou com outras petroleiras ou foi só com a 3R?
Oddone: A gente só fez oferta para a 3R. Esse cenário (de consolidações) é um cenário conceitual que não tem uma data limite para acontecer. Só acredito que essa é uma tendência que vai continuar perdurando, e a gente vai ver mais desses movimentos ao longo do tempo.

Broadcast: Poderia surgir então mais uma fusão?
Oddone: No Nordeste sim. Mas não penso em uma fusão, a gente pensa em acordos operacionais, para capturar valor nas operações das duas empresas.

Broadcast: Estão previstas demissões nesse processo de sinergia?
Oddone: Tem muita sinergia. Não é um acordo pensado para sinergia em recursos humanos, até porque as companhias são muito complementares. A grande massa de trabalhadores da 3R está no onshore e da Enauta é 100% offshore. Então, quando a gente combina isso, a gente vê que a grande parte da sinergia está muito mais na parte financeira e operacional do que na parte administrativa. A gente não espera grandes revoluções na questão de estrutura e grandes reduções de número de funcionários. Não é a motivação dessa transação. As sinergias são muito relevantes, mas no operacional e no financeiro. Não são relevantes do ponto de vista de administração.

Broadcast: Bancos calculam que essa sinergia está na casa de US$ 1 bilhão, o senhor consegue detalhar?
Oddone: Pode usar os números dos bancos. Está certo na ordem de grandeza. Está razoável o que foi feito aí pelo pelos próprios bancos que estavam fazendo assessoria para nós e para a 3R. O número é mesmo na casa de US$ 1 bilhão. O principal está em sinergias operacionais, comerciais e financeiras.

Broadcast: E as empresas se combinam em ESG também?
Oddone: A Enauta é a empresa mais destacada entre as independentes brasileiras em ESG. É a única do setor que está no índice de sustentabilidade da B3. Então acho que a Enauta vem se dedicando a isso, até porque é uma empresa mais tradicional. É a que está há mais tempo na estrada. Então é a mais destacada em relação a ESG, tem quase metade das funções de liderança com mulheres, 44%. A 3R não está no índice de sustentabilidade da B3, por exemplo, como a Enauta está. Mas é um dos pontos de alinhamento que a gente vai ter que fazer na transição.

Contato: monica.ciarelli@estadao.com, denise.luna@estadao.com e gabriel.vasconcelos@estadao.com
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