Economia & Mercados
28/08/2020 18:59

Especial: câmbio sobe menos no 2tri20, e empresas adequam posições ao dólar acima de R$ 5


Por Matheus Piovesana

São Paulo, 28/08/2020 - Quando a Suzano reportou os resultados do primeiro trimestre, uma linha do balanço roubou as atenções de todas as demais: a do resultado financeiro. A maior produtora de celulose de eucalipto do mundo teve perdas líquidas de R$ 22,444 bilhões nesta parte dos resultados, em grande parte pelo salto de 30% do dólar no período, provocado pela combinação entre covid-19 e instabilidade política do País. A Suzano, porém, não foi a única. Naquele mesmo 14 de maio, JBS e CSN reportaram prejuízos causados em grande parte pelo efeito da variação cambial sobre o balanço patrimonial.

Nos três casos, que simbolizam os efeitos não necessariamente positivos do câmbio volátil sobre os balanços de exportadoras, o segundo trimestre trouxe perdas consideravelmente menores. O resultado financeiro da Suzano, por exemplo, melhorou 75%. O JBS teve incremento de 64,5%, e o da CSN saiu de perdas bilionárias para um ganho de R$ 285 milhões, explicado, principalmente, pelo menor impacto da variação cambial líquida.

Esse "susto" mais brando é reflexo da menor variação do dólar no período. Embora ainda em nível alto, acima dos R$ 5, a moeda americana teve alta de 4,6% entre 31 de março e 31 de junho. Em paralelo, as companhias alteraram suas posições de proteção cambial para refletir melhor o "novo normal" da moeda, que, para analistas, deve ficar perto de R$ 5 por um bom tempo, dada a baixa recorde da taxa Selic e os riscos fiscais e políticos brasileiros, que ainda "desanimam" o dinheiro estrangeiro de ficar por aqui.

"No segundo trimestre, o consenso já era de que haveria um estresse no câmbio, porque o primeiro pegou todo mundo de surpresa, e houve uma quebra das estratégias de proteção", afirma Jerson Zanlorenzi, responsável pela mesa de renda variável e derivativos do BTG Pactual Digital. Segundo ele, as empresas correram para adequar seus balanços à nova realidade. "O cenário-base mudou. O mercado trabalhava com essa perspectiva de o dólar não ficar acima de R$ 5, mas quase não vemos mais isso."

No balanço da Suzano, isso é perceptível nas operações de Zero Cost Collars, em que a empresa fica, ao mesmo tempo, comprada e vendida em dólares a diferentes valores. A ideia é criar uma "banda cambial" dentro da qual o fluxo de caixa vai transitar, com o objetivo de proteger as receitas auferidas no exterior de uma valorização excessiva do real. O problema é que quando a moeda brasileira cai demais e o dólar passa a ser negociado no mercado acima dos limites da "banda", as companhias precisam fazer a marcação a mercado negativa dos valores dos derivativos, para refletir o quanto perderiam se tivessem de liquidar as posições naquela data. O dinheiro não sai do caixa, mas a perda impacta os lucros - e assusta muitos investidores.

No primeiro trimestre, a maior cotação do dólar prevista pelos ZCCs da Suzano era de R$ 4,94. Um trimestre depois, a companhia adicionou duas novas posições aos ZCCs contratados: uma em que o dólar vai de R$ 4,58 a R$ 5,34, e outra em que varia entre R$ 5,09 e R$ 6,18. A maior parte da posição, entretanto, ainda está em cotações abaixo de R$ 5.

Entre as companhias do Ibovespa, outras lançam mão de instrumentos semelhantes, como a BRF e a Braskem. Incluindo outros tipos de variação - como cobranças de impostos -, a primeira teve uma melhoria de 68,6% no resultado financeiro no segundo trimestre em relação ao primeiro, com queda de 40,2% nos custos com variação cambial. Na segunda, a melhoria foi de 43% no resultado geral, com impacto 54% menos negativo na linha cambial.

Ainda um bom negócio

A aparente complexidade das posições cambiais das companhias, porém, não reduz o ânimo do mercado com teses dolarizadas. Pelo contrário: enquanto as interrogações sobre o cenário doméstico se acumulam, a conclusão do investidor é que é melhor se expor a economias que, por suas características fundamentais, têm recuperação mais rápida que a brasileira. Comprar ações de exportadoras é uma maneira de fazer isso mantendo recursos na B3.

"A pergunta que tem que ser feita é: as exportadoras ganham dinheiro no 'net', ou seja, considerando receitas e custos? Nesse momento, a resposta é sim", comenta Daniel Gewehr, estrategista-chefe de ações para Brasil e América Latina do Santander. Ele reconhece que a discussão sobre o que sobressai, se o peso sobre as dívidas ou o impulso às receitas, não tem um consenso. Mas vê mais sinais positivos. "A marcação a mercado trimestral não tem efeito caixa. A grande questão é o fluxo de caixa", explica.

Os balanços do segundo trimestre provaram este ponto. Juntas, as processadoras de proteína animal lucraram 123% a mais do que no ano anterior, ajudadas principalmente pela força dos negócios no exterior em um momento de real desvalorizado. E embora casas como o Bank of America comecem a recomendar a compra de reais, nenhuma vê a moeda saltando a níveis muito acima dos atuais ante o dólar. O próprio BofA vê o dólar caindo a R$ 5,20. Para dezembro, o Santander espera a divisa cotada a R$ 4,95.

Tudo combinado, a percepção é de que com as variações cambiais jogando mais a favor do que contra os balanços daqui em diante, as exportadoras devem seguir como as "vedetes" da Bolsa. "O Brasil é tradicionalmente exportador, e com o dólar forte, os investidores se apoiam nesses papéis. Os Estados Unidos e a China têm economias com respostas mais rápidas que a nossa, então, a perspectiva para esses setores é melhor", comenta Zanlorenzi, do BTG.

Contato: matheus.piovesana@estadao.com
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