Economia & Mercados
17/10/2022 09:00

Especial: Guedes vende Brasil como 'fora de sintonia' global e colhe apoio para o BID


Por Aline Bronzati, enviada especial

Washington, 16/10/2022 - O ministro da Economia, Paulo Guedes, vendeu o País como "fora de sintonia" da economia global, nas reuniões anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI). Enquanto líderes alertaram para uma crise maior e mais profunda, ele levou um quadro diferente do Brasil, na contração daquele geralmente visto em países emergentes nos momentos de turbulência. Aproveitou ainda a viagem à capital dos Estados Unidos para colher apoio para a indicação à presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e evitou o tema eleições.

"O Brasil está à frente da curva. Nós agimos antes. Talvez, pelas nossas experiências passadas, a gente já vê um perigo e começa a agir rápido", disse Guedes, a jornalistas, após concluir sua agenda no âmbito das reuniões do FMI.

De acordo com ele, as economias avançadas seguirão revendo o crescimento para baixo e a inflação para cima, o que exigirá juros mais altos, por um período maior. Por sua vez, o desemprego vai crescer. O Brasil, segundo ele, está na contramão. "Nós já fomos no fundo do poço e estamos voltando. E eles ainda estão indo. Nós já bebemos a água e estamos voltando. Eles estão indo beber a água. Tem uma onça lá esperando. A ficha está caindo", afirmou Guedes, ao falar dos países desenvolvidos, acrescentando que, ao menos, a "complacência acabou" e houve o reconhecimento de que a crise será "mais profunda e longa".

Enquanto as economias avançadas preveem que os juros terão de subir mais e por um longo período para combater a escalada dos preços, no Brasil, o debate, diz, é quando o Banco Central (BC) começará a reduzi-los, considerando o cenário de trégua na inflação. Guedes acredita que, ao apertar o cinto antes, o País já conseguirá começar afrouxá-lo a partir de 2023.

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse que há uma dinâmica melhor, mas que não há motivos para comemorar. "Tivemos três meses de deflação agora, seguidos. Muito disso é por causa das medidas do governo. Portanto, não achamos que seja um motivo especial para comemorar. Mas a dinâmica está melhorando", avaliou, ao falar a uma plateia de banqueiros centrais, neste sábado.

Já o Fundo Monetário Internacional (FMI) reconheceu a lição de casa feita por países da América Latina, mas alertou para maiores pressões inflacionárias em países como Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru. "Os bancos centrais da região agiram rapidamente e mantiveram ancoradas as expectativas de inflação de longo prazo. No futuro, a política monetária deve manter o curso e não relaxar prematuramente", avaliou, em documento publicado durante suas reuniões anuais.


Foto: Aline Bronzati/Estadão Conteúdo - Legenda: Guedes fala a jornalistas após reuniões no FMI, em Washington

Quanto ao crescimento do Brasil, o FMI revisou para cima suas projeções para 2022, para 2,8%, mas uma desaceleração para 1,0% no próximo ano. Crítico do FMI, Guedes rebateu os números e disse que o Fundo vai continuar errando. "O Brasil vai continuar crescendo 3% nos próximos anos, inclusive em 2023. Eu disse ao FMI", afirmou Guedes.

O ministro brasileiro antecipou que Campos Neto assegurou a ele que o BC vai revisar o crescimento do País para 3% neste ano. Atualmente, é de 2,7%, abaixo do próximo FMI.

Durante sua passagem por Washington, Guedes também fez críticas às projeções para o Brasil em geral, alegando que parte dos economistas erram por questões técnicas, caso do FMI, e outros por "militância, narrativa política". Segundo ele, o governo mudou o modelo de crescimento do País, hoje calcado em investimentos privados e não mais públicos, e que os modelos matemáticos ainda não conseguiram capturar essa nova dinâmica.

BID

Além disso, o ministro brasileiro aproveitou a viagem para colher apoio para a candidatura ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O Brasil vai indicar o nome do ex-presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, para tentar vencer a disputa da cadeira, conforme antecipou mais cedo o Broadcast. O Brasil nunca deteve a presdiência do BID.

"Eu conversei com Argentina, conversei com Chile, que vai lançar candidato, e estou tentando fazer uma aliança com a Colômbia, foi uma boa reunião. Com a [Janet] Yellen [secretária do Tesouro dos Estados Unidos] eu puxei para um canto, conversei, adiantei um nome para ela, ela aparentemente gostou, mas não há compromisso, disse que seria favorável se fosse consultada", relatou Guedes, a jornalistas.

Sobre o risco de falta de apoio por conta das eleições, Guedes justificou que escolheu um nome técnico. "Estou sugerindo alguém que esteja mais ou menos fora da política, que seja conhecido em Washington, que ninguém vai dizer que é do lado A ou do lado B ou do lado C ou do lado D, é na verdade um quadro típico de Washington, um perfil típico da burocracia internacional, no bom sentido, ele tem chance", afirmou.

Além de reuniões bilaterais com México, Chile, Argentina e Colômbia, o ministro brasileiro se reuniu com representantes da Organização Mundial do Comércio (OMC) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da qual o Brasil está tentando fazer parte. Também falou a empresários norte-americanos, incluindo nomes como FedEx, PepsiCo, Pfizer, Cargill, Exxon Mobil, entre outros.

Guedes participou ainda de conferências realizadas pelo JPMorgan e pelo Itaú Unibanco, em paralelo às reuniões anuais do FMI, falando a investidores estrangeiros e nacionais. Dentre os presentes, nomes como o da gestora Temasek, com sede em Cingapura, Goldman Sachs Asset, a norte-americana Van Eck Associates, Elo Mutual Pension, baseada na Finlândia, e outros. Na pauta, novamente, o Brasil "fora de sintonia" e nada de eleições. O ministro voltou a criticar o desenho do teto de gastos e disse que vê o Mercosul "indo para o buraco".

Contato: aline.bronzati@estadao.com
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