Economia & Mercados
30/07/2021 14:59

Especial: Deterioração ininterrupta de inflação aumenta apostas de Selic em campo restritivo


Por Thaís Barcellos

São Paulo, 28/07/2021 - A deterioração ininterrupta do cenário inflacionário não só aumentou a chance de aceleração do ritmo de aperto monetário em agosto como tem engrossado as apostas de que a Selic alcance um nível restritivo no fim do ciclo, a uma taxa nominal da ordem de 8%. Diante de uma inflação que pode bater em 7% este ano, economistas consultados pelo Broadcast argumentam que o Banco Central pode ir além do nível neutro para buscar a meta de inflação de 2022, cujo centro é de 3,50%.

Desse modo, o juro básico pode funcionar como uma força contrária ao crescimento econômico em 2022, mas parte dos analistas minimiza esse efeito diante do impulso da imunização completa da população brasileira e da valorização de commodities.

Hoje, BNP Paribas e Banco Fibra passaram a prever que a taxa Selic deve alcançar 7,5% no fim deste ano e 8,5% no ano que vem. As duas se juntam, por exemplo, à Quantitas Asset, que há mais de um mês já espera um cenário ligeiramente restritivo para a política monetária, com o juro básico chegando a 8,25% no começo de 2022.

Outras instituições também aumentaram as apostas para a taxa Selic desde a última sexta-feira (23), quando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA-15) de julho mostrou um quadro mais preocupante, mas ainda veem o juro em um nível neutro, ao redor de 3,0% em termos reais, segundo o Banco Central.

É o caso de Barclays, LCA Consultores e Tendências Consultoria. Os dois primeiros esperam 7,5% para a taxa Selic no fim do ciclo, enquanto a última consultoria vê o juro terminal em 7%. Todas as seis casas citadas também alteraram a aposta para o Comitê de Política Monetária (Copom) de agosto, de alta de 0,75 ponto porcentual para 1,00 ponto, seguindo a sinalização do colegiado de que poderia fazer um ajuste mais tempestivo, a depender da evolução do cenário de inflação.

"O BC abriu a opção de fazer um ciclo mais agressivo e os fatores caminharam para lá", resume o economista-chefe para América Latina do BNP Paribas, Gustavo Arruda.

Como o cenário de inflação tem se mostrado consistentemente pior, Arruda acrescenta que é uma indicação de que o BC deve optar por um juro mais restritivo no final do ciclo. "Com a inflação no fim de 2021 a 7%, para que volte à meta em 2022, o juro tem que caminhar para um ambiente mais restritivo."

O economista acrescenta que todos os vetores apontam mais inflação. Ele cita que as indicações são de que os problemas na cadeia industrial ainda devem estar presentes em 2022 e podem conviver com os preços de serviços mais fortes após a reabertura econômica ampla. O BNP também acredita que as cotações das commodities devem continuar fortes e a liquidez global, alta. Além disso, há riscos derivados do processo eleitoral no ano que vem.

Arruda, contudo, reforça que o cenário restritivo para a Selic neste ciclo não significa que o banco acredite que o juro de equilíbrio do Brasil será mais alto. Mas é cedo para ter essa discussão neste momento, em sua visão.

Da mesma forma, o economista-chefe da Quantitas, Ivo Chermont, considera precipitado prever se o juro pode voltar ao nível neutro depois de 2022. "O carro está virando a curva e estamos tentando estimar com muita dificuldade como será o fim dela. É muito cedo para pensar na outra curva", frisa, citando as incertezas ligadas à condução da política econômica após a eleição de 2022 e à política monetária dos EUA.

Arruda e Chermont também concordam que, apesar do nível restritivo, a Selic não deve ser um fardo para o crescimento econômico em 2022. "É um pouco restritiva, mas não é um obstáculo ao crescimento de 2022, que deve ser beneficiado pelo avanço da vacinação e pela reabertura econômica mais ampla", diz Chermont, que projeta expansão de 2,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2022.

O economista do BNP cita que o banco continua otimista com a economia mundial no ano que vem. "Se, por um lado, teremos uma política monetária mais restritiva, o resto do mundo deve continuar pró-crescimento", diz, acrescentando que as commodities devem seguir favorecendo o PIB brasileiro, principalmente na virada do ano. O BNP estima crescimento de 3,0% para o PIB de 2022, considerando um carrego estatístico de 1,2% a 1,3%.

Motivos de desaceleração

Já o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, elenca a política monetária menos estimulativa como um dos motivos que devem explicar a desaceleração econômica esperada já para o segundo semestre deste ano, além do fiscal menos expansionista, da crise hídrica e da lenta vacinação. Para 2022, a estimativa de PIB é de 1,7%.

No Banco Original, o economista-chefe Marco Caruso e a economista Lisandra Barbero também acreditam que a Selic em um nível levemente restritivo, em 7,25%, é um dos fatores que explicam a projeção para o PIB de 2022 abaixo do consenso, em 1,5%, além do desemprego alto.

No Barclays, o economista para Brasil, Roberto Secemski, destaca que sua estimativa de 7,5% para a Selic no fim do ciclo está na banda superior do intervalo da taxa neutra. Considerando sua projeção de 3,8% para a inflação oficial no ano que vem, a taxa real seria de 3,6%. Há ainda a discussão sobre um possível aumento da taxa de equilíbrio devido à deterioração fiscal.

"Se cruzar os 4% em termos reais em direção a um nível maior, é possível que o crescimento sofra mais intensamente, o que colocaria risco de baixa para nossa projeção de 1,9% para o ano que vem."

Contato: thais.barcellos@estadao.com
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