Economia & Mercados
28/05/2021 17:08

Especial: com reservatórios na mínima, temor de GSF volta a assombrar hidrelétricas


Por Wilian Miron

São Paulo, 28/05/2021 - Em meio a um cenário desfavorável para a geração de energia na fonte hídrica, as principais geradoras de energia podem voltar a sofrer com o fantasma do risco hidrológico (GSF, da sigla em inglês) no segundo semestre deste ano.

Diante deste cenário, algumas das principais casas de investimentos começam a demonstrar preocupação com a situação, provocando reflexos sobre os preços das ações dessas companhias. Às 16h33, os papéis da Energisa caíam 0,36%; CPFL, 1,73%; EDP, 1,74%; Engie, 1,80%; Cemig, 0,80%, as ordinárias da Eletrobras estavam próximas à linha d’água com baixa de 0,02%, enquanto a Cesp apresentava baixa de 0,42%. Por outro lado, os papéis da Eneva, que é uma das principais geradoras de energia na fonte termelétrica avançavam 2,16% nesta tarde.

Segundo analistas consultados pelo Broadcast Energia, a tendência é que, durante o chamado período seco, as empresas que têm mais ativos de geração hídrica em sua base enfrentem dificuldades para produzir energia, tendo que comprar energia de outras fontes a preços mais caros para honrar seus contratos de fornecimento. Caso essa situação se acentue, a tendência é que as companhias mais expostas ao GSF apresentem dificuldades na geração de caixa dos próximos trimestres.

"Estamos num ponto da curva preocupante, com os reservatórios do Sudeste/Centro-Oeste performando abaixo dos 35% e a gente já começa a ver isso nos balanços de algumas empresas", comentou o analista da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman.

De fato, já nos primeiros meses deste ano, algumas das principais geradoras mostraram reduções significativas na produção de energia devido às chuvas abaixo da média histórica em boa parte do País entre o final de 2020 e os primeiros meses deste ano. De acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o Sudeste/Centro-Oeste, que responde por 70% da capacidade de armazenamento do País, vai encerrar maio com 32,1% de sua capacidade, e a expectativa é que os reservatórios cheguem a 28,9% do volume útil até o final de junho.

A Cesp, por exemplo, com as usinas Porto Primavera, Paraibuna e Jaguari, produziu 21% menos energia entre janeiro e março, em comparação com o mesmo período do ano passado, para 870 megawatts médios (MW Méd).

Situação parecida foi apresentada pela AES Brasil. No primeiro trimestre deste ano, a empresa produziu 2.338,8 gigawatts médios (GW Méd), uma redução de 22,1% em relação ao mesmo período de 2020. A queda foi decorrente da menor afluência nas bacias do Rio Grande e do Tietê durante o período.

Por outro lado, a Engie tem mostrado mais resiliência à falta de chuvas, uma vez que tem a maior parte de sua geração hídrica no Sul do Brasil, onde o armazenamento está em situação menos desconfortável do que no Sudeste/Centro-Oeste. Nos primeiros três meses do ano, a geração hidrelétrica da empresa foi de 7.339 GWh, crescimento de 26,3%. A elevação "se deve, principalmente, às condições hidrológicas mais favoráveis nas bacias hidrográficas da Região Sul onde se localiza grande parte das hidrelétricas".

Esse crescimento da Engie ocorre basicamente por dois motivos. O primeiro é que neste ano o armazenamento no Sul ficou em 63,4% da capacidade do subsistema, ou seja, quase 40% melhor do que o observado um ano antes. Além disso, durante o período úmido de 2021, a região teve afluências melhores do que em outras localidades, contribuindo para a geração de energia. Contudo, diante de uma perspectiva de menos chuvas e com a demanda por energia se recuperando nos próximos meses, o prognóstico para a geração no Sul também não é das melhores.

"É uma situação muito ruim para as geradoras, porque à medida que elas têm o reservatório vazio, e a demanda voltando ao normal, precisam contratar alguma energia no mercado spot e começam a ver também o efeito do GSF", disse o analista da Genial Investimentos, Vitor Sousa.

Na avaliação de Sousa, entre as empresas com mais ativos em geração hidrelétrica, a Cesp é a que tem situação mais delicada, já que tem maior volume de energia contratada no longo prazo. Ou seja, maior exposição ao GSF. "No curto prazo é quem fica em situação mais delicada, porque só têm hidrelétricas e está muito contratada para este ano".

Proteção

Já em relação à AES Brasil e Engie, os analistas acreditam que o hedge que elas costumam fazer ao manter parte de sua energia descontratada deve mitigar os impactos do GSF. Contudo, elas também podem ter perda de caixa nos próximos trimestres, a depender do nível de dificuldades que terão para produzir energia em suas hidrelétricas, e do tempo que a crise hídrica durar. "Hoje ainda há muita incerteza quando ao fluxo de caixa dessas empresas, uma vez que déficit hídrico deve comer parte dos ganhos delas", explica o analista da Genial Investimentos.

Por outro lado, Arbetman, da Ativa Investimentos, acredita que após a crise hídrica de 2014 essas empresas criaram mecanismos eficientes para gerenciar sua exposição ao GSF, mantendo entre 13% e 20% de sua geração sem contratos de longo prazo. Ainda assim, ele não descarta que a falta de chuvas traga reflexos nos próximos balanços das empresas.

"Para conforto dos nossos investidores, hoje o balanço energético dessas empresas não é tão ruim, então, mesmo que tenham alguma dificuldade nos próximos meses, não acredito que seja igual à de 2014. Talvez o valor [das ações] caia momentaneamente, e isso seria natural. Mas não vejo risco operacional como a gente já viu no setor", analisa Arbetman.

Térmicas e renováveis

Se, por um lado, as empresas que têm mais ativos de geração hídrica tendem a ficar em situação mais delicada nos próximos meses, a avaliação dos analistas sobre as companhias que têm térmicas, eólicas e usinas solares fotovoltaicas em seu portfólio é positiva.

Entram nesta lista a Eneva, que tem atuação focada na geração termelétrica, a Copel, que é dona da Araucária, e a Omega Geração, que tem um portfólio baseado em eólicas e solares.

Arbetman, da Ativa, acredita que, apesar da intermitência das fontes renováveis, elas têm funcionado como um hedge natural para o sistema, garantindo energia em momentos de tempo seco, o que tem levado muitas empresas a diversificarem seu portfólio de geração, como fez a Copel ao comprar o Complexo Eólico Vila, no Rio Grande do Norte. Além disso, essas fontes têm apresentado custo de produção extremamente baixo em comparação com as hídricas e térmicas.

"A gente vê que as companhias que têm acesso a tais usinas apresentam resiliência maior, e têm custos de geração muito baixo, por isso o aumento dos investimentos nesses modelos", disse o analista da Ativa Investimentos.

Contato: wilian.miron@estadao.com
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