Economia & Mercados
02/07/2021 14:43

Especial: Provedores regionais apostam em IPO como resposta ao risco de consolidação


Por Circe Bonatelli. Com colaboração de Cynthia Decloedt

São Paulo, 01/07/2021 - O setor de telecomunicações vai ganhar mais peso na Bolsa ao longo das próximas semanas, com as ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) de três provedores regionais de internet - Brisanet, Unifique e Desktop. Juntas, elas têm potencial de movimentar entre R$ 4 bilhões e R$ 5 bilhões.

A corrida para atrair capital por meio dos IPOs evidencia a estratégia das empresas em lutar pela sobrevivência em um mercado que está passando por um ritmo intenso de fusões e aquisições. Para faturar com banda larga é preciso obter ganhos de escala por meio de expansão das redes, captação de clientes e diluição dos custos. É justamente isso que tem motivado a onda de consolidações nos últimos anos.

Um ponto em comum nos prospectos das ofertas de ações de Brisanet, Unifique e Desktop é o destaque dado ao risco de serem afetadas pelas consolidações. Elas enxergam o perigo de perderem mercado caso as concorrentes cresçam rápido demais. Ou de acabarem sendo 'consolidadas'.

"A companhia não pode garantir que o crescimento sustentado será mantido no futuro. O setor está em processo de crescimento e consolidação", descreve a nordestina Brisanet, no capítulo de fatores de risco de seu prospecto (documento divulgado a potenciais investidores). Ela acrescenta que tem concorrentes "com grande disponibilidade de recursos financeiros" e admite que pode ser "incapaz de responder às pressões de preço resultantes da concorrência".

Na mesma linha, a paulista Desktop afirmou em seu prospecto que "caso os concorrentes sejam mais bem-sucedidos nas estratégias de expansão, isso pode gerar impacto adverso na capacidade de crescimento da companhia".

O ano passado teve um recorde de fusões e aquisições de operadoras no Brasil, com um total de 16 transações, movimentando cerca de R$ 22 bilhões, de acordo com a assessoria financeira RGS Partners. A própria Unifique, que busca o IPO, comprou três provedores catarinenses (Infoway, Snet e Station) que estavam nas cidades onde ela já atua.

A pandemia acentuou a necessidade por banda larga e estimulou ainda mais as iniciativas para consolidação do segmento, observa o sócio da RGS Partners, Fábio Jamra. Com isso, as empresas pequenas, mas com redes de fibra ótica de qualidade e um bom número de clientes em poucas cidades, "se tornaram alvo de aquisição pelas empresas maiores e mais capitalizadas", diz Jamra.

Os investidores enxergam a consolidação como uma oportunidade e por isso, as ofertas das teles regionais e menores devem encontrar demanda em Bolsa, na opinião de agentes do mercado. "As teles regionais carregam uma tese que faz sentido, porque crescem muito, não têm representatividade na bolsa e estão em consolidação", diz o sócio e responsável pelo banco de investimento da XP, Pedro Mesquita.

Crescer ou morrer

Diante desse cenário em ebulição, os recursos previstos com as ofertas de ações serão destinados prioritariamente à expansão dos negócios. Tanto Brisanet quanto Unifique e Desktop pretendem crescer por via orgânica - ampliando a rede de fibra ótica nas cidades onde já estão presentes e em cidades vizinhas - quanto por via inorgânica - comprando rivais.

A Brisanet já é o maior provedor regional de internet fixa do País. A empresa está em 96 municípios espalhados por Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, totalizando 697 mil clientes. O grupo também é dono da rede de franquias Agility Telecom, que firma parcerias para prestação do serviço de banda larga. Só na franquia são mais 140 mil usuários.

A Unifique tem 349 mil assinantes espalhados por 130 municípios de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. O seu forte é o mercado catarinense, onde seu market share chega a 25%. A Desktop atua na região metropolitana de Campinas (SP), abrangendo 37 cidades e 264 mil assinantes.

Pequenos contra grandes

Existem cerca de 4 mil provedores regionais no Brasil. O universo tem perfis variados. Há desde empresas familiares, que atendem alguns milhares de clientes, até companhias com grandes parceiros financeiros e se aproximando de 1 milhão de assinantes.

Essas empresas são muito fortes no interior do País, que nunca foi o foco das grandes teles, tradicionalmente mais atuantes nas capitais. Pouco a pouco, os provedores regionais foram ganhando o mercado e chamando a atenção de investidores.

Juntas, essas empresas já detêm 41% do mercado de banda larga no Brasil, à frente de Claro (27%), Vivo (18%) e Oi (14%), de acordo com dados da consultoria Teleco. Há três anos, os provedores regionais tinham uma fatia de apenas 25% do todo.

"As grandes empresas costumavam dizer que certos lugares eram 'osso', mas os empreendedores regionais mostraram que tem, sim, demanda por internet de qualidade. E construíram redes interessantes", afirma Luiz Henrique Barbosa, presidente da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecom Competitivas (Telcomp).

O avanço dos provedores regionais ocorreu por uma mistura de fatores. O mais óbvio é a demanda crescente por internet rápida, que cresceu na pandemia. E as empresas locais foram ágeis em investir nas redes de fibra ótica, o que favoreceu oferta de pacotes de bons níveis de qualidade muito antes da pandemia começar A Unifique, por exemplo, está lançando banda larga de 2Gb. A velocidade média atual da sua rede é de quase 300Mb.

Outro fator que ajudou foi a resolução da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) número 694, de 2018, estabelecendo que só empresas com mais de 5% de participação no mercado estarão sujeitas à regulação. Isso deu liberdade para que muitos empreendedores se desenvolvessem, aponta o conselheiro da Anatel, Emmanoel Campelo. "Tem espaço para o provedor regional crescer bastante sem se preocupar com a carga regulatória da agência", afirma.

Contatos: cynthia.decloedt@estadao.com
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