Economia & Mercados
28/04/2022 11:00

Especial: Concorrência e potencial do mercado empurram a Binance ao ambiente regulado no Brasil


Por Cynthia Decloedt e Aramis Merki II

São Paulo, 27/04/2022 - A intensa movimentação de Bolsas e outras estrangeiras do mundo cripto em direção ao Brasil pode forçar a chinesa Binance a operar de modo regulado no País. A provável aquisição da 2TM, dona do Mercado Bitcoin, pela maior corretora de criptoativos dos Estados Unidos, Coinbase, surge como um dos maiores fatores de pressão. A norte-americana, listada na Nasdaq e que segue as regras dos países onde opera, tende a ser um dos grandes concorrentes da Binance no Brasil e na América Latina.

Ontem à noite, o Senado aprovou o projeto que regulamenta o mercado de criptomoedas no Brasil e que ainda deverá passar pelo crivo da Câmara. A Binance, alvo de muita controvérsia por conta de sua atuação à margem das regras locais brasileiras vigentes para o mercado financeiro, sinalizou estar comprometida com as mudanças que vem por aí. "A Binance está totalmente comprometida com compliance e acredita que a regulamentação é o único caminho para que a indústria cripto possa se desenvolver e atingir o grande público", afirmou em resposta por email. A aquisição da Sim:paul, corretora brasileira autorizada pelo Banco Central e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) "reforça isso", acrescenta a empresa.

Ao mesmo tempo, em suas respostas, a Binance reitera o discurso do caráter global e sem fronteiras dos criptoativos, o qual tem sido usado para se defender de acusações de atividade irregular no Brasil e em outras partes do mundo de onde foi banida. "Criptoativos existem em rede, para além das fronteiras. Por isso, a regulação desse segmento precisa ser compreendida em um contexto global e ser precedida de debates aprofundados", afirma a empresa.

Além da aquisição da Sim:paul, a Binance vem fazendo outros vários movimentos que apontam em direção a uma atuação em linha com a regulação. Seu fundador, o sino-canadense Changpeng Zhao, em visita feita ao País em março, assegurou a abertura de filial no Brasil e que passará a atuar no ambiente regulado. As opiniões sobre a adesão da Binance à regulação, no entanto, se dividem.

O professor e advogado Isac Costa, especialista em regulação, está na ponta dos céticos. "A Coinbase pode ser um divisor de águas em termos concorrenciais, entretanto, existem razões para que a Binance continue operando à margem", afirma. Segundo ele, dois de seus grandes grupos de clientes, aqueles que são da contracultura e não querem ser identificados e os que querem lavar dinheiro, não vão migrar para plataformas reguladas ou para a Coinbase. A maioria das criptomoedas não exige que você se identifique para participar da rede, explica o professor.

"A tecnologia já foi criada para o anonimato e as exchanges centralizadas surgiram como uma anomalia nesse mercado", acrescenta. Costa lembra que os governos começaram a alcançar as plataformas, que, por sua vez, perceberam que teriam de ter um controle mínimo. "A grande sacada da Binance é que ela não tem sede e isso impede que o Estado chegue até ela", diz.

O advogado lembra ainda que, por outro lado, a Binance investe pesado em publicidade e se utiliza de marketing para exibir legitimidade da sua operação aos olhos do público. Um exemplo disso, na opinião de Costa, são os encontros de CZ, como é conhecido o fundador e CEO da empresa, com o então governador do Estado de São Paulo, João Doria, e do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, durante visita ao Brasil. A marca também figurou entre as patrocinadoras do Campeonato Paulista deste ano.

Veto

A Binance é proibida de operar em países como Malásia, Cingapura, Tailândia e Ilhas Cayman, além de enfrentar restrições no Reino Unido, Japão e Estados Unidos. Neste último, a estratégia foi abrir uma outra empresa, a Binance.US. "Foi o único país em que fizeram este 'puxadinho', mas você ainda tem uma fluência na operação da Binance nos EUA", diz Costa. Ele ressalta que fora este caso, a exchange não se adequou para voltar aos lugares de onde foi expulsa. Na visão dele, isso mostra que o discurso da empresa, de se enquadrar às regulações, é diferente do que é praticado. No Brasil, a empresa também sofre limitações e não oferta operações no mercado de derivativos.

A postura por aqui pode ser diferente porque o mercado brasileiro é estratégico, na visão de Paulo Brancher, advogado que compõe a área de ativos digitais do escritório de advocacia Mattos Filho. O responsável para América Latina da OSL, plataforma cripto para investidores institucionais, ressalta a importância do Brasil neste mercado, considerado a bolsa da vez. "Por causa disso, quando a regulamentação de fato vier, o que vai ocorrer é uma adequação natural dos players", diz.

Contatos: cynthia.decloedt@estadao.com e merki@estadao.com
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