Agronegócios
09/07/2018 10:00

Perspectiva: mercado de grãos deve monitorar disputas comerciais dos EUA


São Paulo, 09/07/2018 - Investidores dos mercados futuros de soja, milho e trigo na Bolsa de Chicago (CBOT) devem começar a semana atentos à demanda por grãos norte-americanos após a confirmação das tarifas de importação chinesas. As disputas comerciais dos EUA com outros países além da China continuam sendo monitoradas. As previsões para o clima nos EUA e em importantes regiões produtoras como o Mar Negro também devem direcionar o mercado agora que as lavouras do país começam a entrar em etapas mais importantes para definição de rendimento.

Com relação à soja, a imposição de tarifa de importação pela China sobre a soja norte-americana, confirmada na sexta-feira, deve ampliar a demanda chinesa pela oleaginosa do Brasil, mas os futuros de soja na Bolsa de Chicago tiveram alta de mais de 4% após a notícia. Analistas ressaltaram que os preços já caíram muito nos últimos meses em antecipação à tarifa e que o preço mais baixo da soja norte-americana em relação à brasileira atrai o interesse não só de tradicionais importadores como até mesmo de fábricas do Brasil. Às 00h01 de Washington (01h01 de Brasília) de sexta-feira tiveram início as tarifas comerciais de 25% dos EUA sobre US$ 34 bilhões em importações chinesas. Em seguida, a China anunciou medida na mesma proporção e acusou os EUA de iniciarem a maior guerra comercial da história econômica. Também na sexta-feira, a Rússia anunciou tarifas de 25% a 40% sobre a importação de produtos dos EUA de construção, petróleo e mineração, em resposta às tarifas aplicadas pelos EUA sobre o aço e alumínio estrangeiros.

Na sexta-feira, o vencimento novembro avançou 38,75 cents (4,53%) e fechou em US$ 8,9450 por bushel. Na última semana, o vencimento subiu 1,65%. Entretanto, a soja ainda acumula perda de quase 12% nos últimos 30 dias. "Os preços caíram bastante. O mercado já tinha embutido nas cotações a possibilidade de tarifas da China", disse a analista Ana Luiza Lodi, da INTL FCStone. "Ao mesmo tempo, os prêmios no Brasil estão bem fortalecidos. A queda dos futuros em Chicago acaba favorecendo a competitividade da soja norte-americana." Ela lembrou que as compras de soja por parte da China nos EUA estão fracas desde que se começou a falar em tarifas, mas ponderou que a China precisa importar quase 100 milhões de toneladas de soja e não vai conseguir todo esse volume sem importar uma parte dos EUA. "Investidores estão aguardando para ver o que vai acontecer com as compras chinesas de soja norte-americana."

Conforme Andrea Cordeiro, da Labhoro, embora o Brasil não consiga abastecer sozinho a demanda chinesa, a soja norte-americana tende a ser direcionada para outros mercados. "Os norte-americanos já vêm trabalhando com reposicionamento de demanda. Por um lado, perdem um porcentual da demanda chinesa, porém acabam conseguindo suprir outros mercados." Segundo o relatório semanal de exportação dos EUA, exportadores norte-americanos venderam 561,6 mil toneladas de soja da safra 2017/18 na semana encerrada em 28 de junho, para Holanda (162,1 mil t), Paquistão (134,7 mil t), Bangladesh (109,3 mil t), Japão (80,4 mil t) e Alemanha (79,6 mil t). Para a safra 2018/19, foram vendidas 458,7 mil toneladas para México (193,6 mil t), destinos não revelados (187,5 mil t), Vietnã (60,5 mil t) e Tailândia (35,1 mil t). "Você já começa a ver nas vendas semanais o reforço de outras origens além da chinesa", disse Andrea. Entretanto, a China cancelou 366 mil toneladas da safra 2017/18 e 66 mil toneladas da safra 2018/19. Para Andrea, daqui para frente, se esse movimento continuar, pode ter nova pressão baixista sobre a CBOT. "É um momento do mercado que não tem precedentes." O analista de mercado Adriano Gomes, da AgRural, lembrou que, como os EUA estão em disputa comercial com outros países, eles podem seguir o exemplo da China e aplicar sobretaxas sobre produtos agrícolas norte-americanos em retaliação a tarifas adotadas pelos EUA.

De acordo com Andrea, a primeira percepção do mercado após a confirmação de tarifas nesta sexta-feira foi de "venda no boato e compra no fato", ou seja, de que o risco de sobretaxa já havia feito o mercado cair demais, mas a analista lembrou ainda que está sendo cada vez mais comentada a possibilidade de importação de soja norte-americana para o Brasil. Na quinta-feira, o conselheiro da Associação Nacional de Exportadores de Grãos (Anec) Luiz Barbieri disse que o Brasil pode ampliar as suas exportações e importar soja norte-americana para processar internamente. "É bastante possível importarmos de 500 mil a 1 mi de t de soja dos EUA para processamento." Segundo ele, isso poderia ocorrer em outubro e novembro e o volume dependerá "de quão extrema será a disputa entre EUA e China".

Na sexta-feira, outros dois fatores ajudaram a dar suporte aos preços: o calor extremo em áreas produtoras nos EUA e a queda do dólar no exterior, que torna commodities produzidas nos EUA mais atraentes para compradores estrangeiros. "O clima norte-americano nas últimas duas semanas tem tido um padrão mais seco e quente do que o normal", ressaltou Andrea. A previsão era de chuvas moderadas para o norte dos EUA e de moderadas a fortes para o sudeste e leste do país e permanência de tempo seco no centro dos EUA e em boa parte de Oklahoma e do Texas, segundo boletim meteorológico da Labhoro. As temperaturas máximas devem ficar entre 26ºC e 32ºC no leste do cinturão e oscilar entre 32ºC e 37ºC nas demais áreas, com uma região do norte do Kansas podendo registrar máximas superiores a 40ºC.

Quanto ao milho, os futuros fecharam em alta na sexta-feira na CBOT, refletindo condições climáticas menos favoráveis em regiões produtoras dos Estados Unidos. Tomm Pfitzenmaier, da Summit Commodity Brokerage, disse que o cinturão de milho do país está entrando em um período mais seco, o que pode ser bom para algumas regiões que tiveram umidade em excesso. "Ainda assim, traders estarão monitorando a situação para ver quanto tempo dura o período de estiagem", disse. O vencimento dezembro subiu 8,50 cents (2,33%) e terminou em US$ 3,73 por bushel. Na semana, a alta foi de 0,47%. Os ganhos também foram sustentados pela desvalorização do dólar no mercado internacional, que melhora a competitividade de commodities produzidas nos EUA.

A renúncia do administrador da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês), Scott Pruitt, contribuiu para a alta. Sob a administração de Pruitt, a agência permitiu que várias pequenas refinarias não cumprissem a exigência de volume mínimo de combustíveis renováveis, como etanol de milho, que deve ser misturado a combustíveis fósseis. Segundo a Associação de Combustíveis Renováveis dos EUA, que representa fabricantes de etanol, a renúncia provocou um suspiro de alívio no Meio-Oeste.

Com relação ao trigo, os futuros de trigo negociados na CBOT fecharam em alta na quinta-feira, acompanhando o desempenho do milho. Os dois grãos são substitutos diretos em ração animal e, por isso, tendem a se mover na mesma direção. Na CBOT, o trigo para setembro subiu 9,75 cents (1,93%) e terminou em US$ 5,1525 por bushel. Na semana, o ganho foi de 2,79%.

O clima no norte das Grandes Planícies, onde se desenvolve o trigo de primavera, deve ser mais quente e seco nos próximos 10 dias, o que pode reduzir a umidade do solo. Na região do Mar Negro, as temperaturas diminuíram no sul e leste da Ucrânia e no sul da Rússia, ajudando a aliviar o estresse das lavouras, mas não há previsão de chuvas de volume expressivo nesta semana.

Café: contratos caem 0,9% na semana
Os contratos futuros de café arábica apresentaram desvalorização de cerca de 0,9% (100 pontos) na semana passada na Bolsa de Nova York (ICE Futures US), base setembro de 2018. As cotações encerraram na sexta-feira (6), a 114,10 centavos de dólar por libra-peso. No período, os contratos marcaram máxima de 116,15 cents (sexta, dia 29) e mínima de 106,90 cents (sexta, dia 6).

O Escritório Carvalhaes, tradicional corretora de Santos (SP), destaca em boletim semanal que o mercado físico brasileiro de café teve uma semana de poucos negócios. "Nota-se volume maior de vendas nas áreas produtoras de conilon e na Zona da Mata, onde tradicionalmente os cafeicultores vendem sua produção mais cedo", diz Carvalhaes. Nas demais regiões os produtores estão com a atenção voltada para os trabalhos de colheita, que já entraram em velocidade de cruzeiro.

Conforme Carvalhaes, apesar da forte alta do dólar frente ao real, a queda das cotações em Nova York represa os preços em reais e trava as vendas dos lotes recém-colhidos. Insatisfeitos com os preços oferecidos, os cafeicultores, principalmente os que produzem arábica, procuram vender apenas o necessário para cobrir as despesas mais próximas. O quadro político brasileiro, a proximidade das eleições, a insegurança com os rumos da economia brasileira, a alta nos custos de produção e os preços praticados pelo mercado, desestimulam as vendas.

Segundo Carvalhaes, muitos produtores avaliam que o melhor lugar para deixar o produto de um ano de trabalho é em café. Cotado em dólares, com o consumo interno e mundial em alta, estoques governamentais zerados e remanescentes privados bastante baixos - insignificantes para o porte da cafeicultura brasileira - consideram manter o café em seus armazéns uma opção segura de investimento para os tempos difíceis que a economia brasileira está enfrentando. "Os primeiros lotes de arábica que chegam ao mercado mostram que a safra deve ser de boa qualidade e mais bem composta em peneiras do que a anterior", comenta.

Açúcar: mercado deve continuar com inclinação negativa
O mercado futuro do açúcar demerara na Bolsa de Nova York (ICE Futures US) segue com cenário negativo no curto prazo diante do superávit global da commodity. Na sexta-feira, o contrato outubro, mais negociado, fechou em leve alta, de 3 pontos, ou 0,26%, para 11,51 cents por libra-peso, ajudado pelo dólar em queda no Brasil.

Hoje, após o fechamento do mercado, a Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC, na sigla em inglês) divulga relatório sobre o posicionamento dos traders na semana encerrada na terça-feira (3). No último documento, relativo à semana encerrada em 26 de junho, fundos e especuladores estavam com saldo vendido de apenas 4.340 lotes, em comparação com 32.240 lotes no dia 19 de junho. A redução nessa posição vendida foi apontada como um dos motivos para a queda nos preços do açúcar na semana passada.

Nesta semana, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) deve divulgar relatório da moagem, produção de açúcar e etanol na última quinzena de junho e no acumulado do primeiro trimestre da safra 2018/2019, iniciada em 1º de abril. O período foi marcado por uma forte estiagem na região, com volume de chuva acumulado abaixo de 100 milímetros (mm), ante uma média histórica em torno de 250 mm.

(Leticia Pakulski, Tomas Okuda e Gustavo Porto - leticia.pakulski@estadao.com, tomas.okuda@estadao e gustavo.porto@estadao.com)
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