Economia & Mercados
31/08/2020 09:48

Especial: Com terreno fértil em problemas, número de startups 'verde' quase dobra no Brasil


Por Aline Bronzati

São Paulo, 31/08/2020 - Repleto de carências que se espalham por todo o território, o Brasil é considerado um terreno fértil para a propagação de startups com 'pegada verde', as chamadas cleantechs. Das mais de 13 mil novatas operantes no Brasil, atualmente há 174 que aliam negócios com sustentabilidade. Embora ainda tímido frente ao todo, o número é quase o dobro na comparação com agosto do ano passado, quando apenas 96 novatas compunham esta lista, conforme mapeamento da Associação Brasileira de Startups (Abstartups).

O movimento que teve início nos Estados Unidos e avançou para a Austrália começa a ganhar corpo, agora, no Brasil. O motor vem do maior interesse de investidores, que passam a ver oportunidades de retornos tão atrativos quanto aos de startups tradicionais, e ainda por parte das grandes empresas, que têm caçado parcerias neste universo.

Recentemente, Banco do Brasil, Klabin, de papel e celulose, e a mineradora Vale anunciaram iniciativas direcionadas às cleantechs. Além de mais dinheiro para financiar novas iniciativas sustentáveis, estimula, principalmente, o fato de o País enfrentar problemas urgentes em diversas áreas como gestão de resíduos, saneamento - principalmente com o novo marco do setor, energia e tantos outros.

"Apesar de estar entre as dez maiores economias do mundo, o Brasil também integra o grupo de países mais desiguais", alerta estudo recente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (Abvcap) em parceria com a consultoria KPMG sobre investimento de impacto.


 Top 5 estados brasileiros - startups com 'pegada verde' 
 Estados   Quantidade   Total em 2020   Total em 2019 
São Paulo 42 174 96
Minas Gerais 28    
Rio Grande do Sul 20    
Rio de Janeiro 12    
Santa Catarina 8    
Fonte: Abstartups

Resolver problemas é tudo o que os empreendedores buscam. "Existia antes um estigma no mercado sobre o que poderia ser uma cleantech e o meio ambiente sempre teve uma posição pessoal de 'ongueiro', mas começou-se a ver que é igual", diz o diretor do comitê de cleantech da Abstartups, Renato Pasquet. "Grandes problemas demandam grandes soluções", acrescenta.

As cleantechs são empresas de tecnologias que têm sustentabilidade no centro da sua operação. Uma empresa de energia solar não necessariamente recebe essa classificação, explica Pasquet. Em contrapartida, aquela que desenvolve um software para comercializar essa energia em rede, utilizando, por exemplo, a tecnologia blockchain, é uma startup sustentável.

"O modelo de negócio por vezes vai definir uma cleantech", diz o diretor da Abstartups, para quem o Brasil é uma "terra produtiva" para a multiplicação das novatas com pegada verde. Ele espera que nos próximos dois anos, esse grupo, ao menos, dobre de tamanho no País.

Um dos impulsos vem por parte das grandes empresas. Como o governo Bolsonaro não tem 'DNA ambiental', o mundo corporativo tem assumido parte dessa responsabilidade.

A Klabin, por exemplo, acaba de lançar mais uma seleção de startups sustentáveis, com foco na escolha de um parceiro para apoiá-la na destinação dos chamados dregs, resíduos sólidos gerados a partir da fabricação de celulose. É a oitava edição do 'Pitch Day', evento de apresentação que une a companhia e novatas.

Os temas são os mais diversos. O primeiro foi para apoiar o setor jurídico da companhia, mas já teve até uma seleção para uma parceira que ajudasse no controle biológico de formigas cortadeiras existentes somente na América do Sul e que comem as mudas das plantas.

"Quase todas as startups que a gente se relaciona têm de seguir preceitos de sustentabilidade e economia financeira. Isso está vinculado até ao tipo de parceria que selamos", diz a gerente de Inovação da Klabin, Renata Freesz.

Dentre as outras iniciativas da companhia com novatas sustentáveis, ela cita o investimento em uma startup de Israel. Segundo Freesz, a Klabin sempre busca primeiro no Brasil, mas também fora. "Nosso papel é fomentar isso. Em termos de maturidade, o mercado de cleantechs está começando no País", avalia.

Com as tragédias de Mariana e Brumadinho em seu histórico, a Vale acaba de lançar ao lado da Firjan Senai um programa para contribuir com o desenvolvimento social do Espírito Santo a partir da ajuda de startups. Os temas estão ligados à gestão de resíduos sólidos e à segurança ferroviária.

De acordo com o gerente de tecnologia e inovação para sustentabilidade da Vale, Sandoval Carneiro, as estruturas horizontais e colaborativas das startups favorecem a agilidade e a criatividade na solução de problemas. "Startups com atuação em projetos sustentáveis têm a capacidade de encontrar soluções de forma ágil e criativa para os desafios nos campos social e ambiental", diz ele, em comentário enviado ao Broadcast.

A maior conscientização vem de vários setores, incluindo, o financeiro. Depois de Bradesco, Itaú Unibanco e Santander se debruçarem em ações em prol da Amazônia, o Banco do Brasil também entrou na onda sustentável. A instituição decidiu separar metade do orçamento de R$ 200 milhões para apoiar startups para um para um fundo verde. É a primeira iniciativa do banco neste sentido.

O objetivo do BB, conforme revelou a Coluna do Broadcast, essa semana, é investir em novatas que sigam a risca critérios ambientais, sociais e de governança (da sigla, ESG). São exemplos empresas que já nasceram adaptadas à economia de baixo carbono ou ainda do setor de agronegócios e que priorizem p uso limitado de defensivos.

O maior interesse dos pesos pesados do mundo corporativo ajuda a deslanchar as novatas com pegada verde. A Pólen, com foco no setor de resíduos e fundada por Pasquet, da Abstartups, está perto de receber a terceira rodada de investimentos. Depois de atrair R$ 1,5 milhão nos dois aportes anteriores, a régua, agora, subiu. Estão previstos entre R$ 5 milhões e R$ 15 milhões, mas os nomes dos investidores ainda são guardados em sigilo.

A nova injeção de recursos visa a financiar o crescimento da Pólen, que superou até mesmo os fundadores. Em 2018, a empresa tinha 174 clientes. Hoje, são mais de 3 mil e a startup já atua em nove países.

"O fato de o tema [sustentabilidade] estar sendo mais discutido ajuda o segmento. O tema está em voga e tem atraído as grandes empresas", diz Pasquet. "As grandes empresas são porta aviões e para que cumpram sua missão se utilizam das startups que atuam como caças para atacar alvos específicos", compara.

Contato: aline.bronzati@estadao.com
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