Política
15/01/2019 12:03

Olhar Global Broadcast: um mundo mais à direita




Os olhos dos investidores se voltam hoje para o Reino Unido por conta da votação do Brexit (saída dos britânicos da União Europeia) pelos parlamentares do país, mas em maio outro Parlamento estará na berlinda, o Europeu. Ao que tudo indica, pela primeira vez, um quinto ou até mesmo um quarto das cadeiras do Parlamento Europeu serão ocupadas por nacionalistas ou protecionistas. A guinada mais à direita da maior Legislatura do continente ficará mais alinhada com o novo governo brasileiro, mas é cedo para estimar as consequências práticas desta mudança.

Até aqui, a Europa era tida como um contraponto a visões mais nacionalistas e ao capitalismo radical de outras partes do globo, como a dos Estados Unidos na era Trump. Mas acontecimentos recentes, entre eles o próprio Brexit, sinalizam que a região deve começar a experimentar em seu próprio território o crescimento de uma ala mais à direita que parecia estar em hibernação. O avanço da corrente começou a ser sentido aos poucos, com vitórias isoladas de alguns populistas em países considerados mais periféricos do continente. O temor agora é que unam forças e tenham participação mais contundente sobre a região.

Seja qual for o número final da eleição ao Parlamento Europeu, o que se tem como certo entre os estudiosos do assunto é que o novo Congresso será altamente fragmentado, como também acontece no caso brasileiro. Internamente, começam a surgir avaliações de que a nova formação criará dificuldade na composição da próxima Comissão Europeia. Também deverá ficar mais custosa a implantação de políticas que aprofundem a integração no continente. Esse novo quadro de destaque da direita no Parlamento está no contexto não só do Brexit, mas também do emaranhado dos movimentos migratórios, da tensão comercial com os Estados Unidos, dos coletes amarelos na França e de movimentos mais isolados em vários países da região.

Ao mesmo tempo, começa-se a identificar e a discutir de modo muito reservado na academia o nascimento de uma espécie de poder paralelo ao Parlamento Europeu, o que se poderia chamar de "shadow parlamento", ou parlamento das sombras. A elite desse grupo seria composta pelos primeiros-ministros populistas de extrema-direita da Itália, Matteo Salvini; da Polônia, Mateusz Morawiecki; e da Hungria, Viktor Orbán, este no cargo desde 2010. Espera-se também um aumento da influência de partidos mais radicais de direita na Dinamarca, na França e até na Alemanha. O objetivo do grupo? Ganhar representatividade e força para impor esse alinhamento ideológico a questões supranacionais.

Além fronteiras europeias, perfil ideológico semelhante é a marca de líderes como Donald Trump e Jair Bolsonaro. Após buscar uma aproximação com os EUA, o governo brasileiro seguiu o exemplo americano e anunciou sua intenção de mudança da Embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Na economia, a promessa de condução focada no liberalismo econômico de Paulo Guedes é bem-vinda, principalmente quando os temas são privatização, flexibilização trabalhista, abertura comercial e reforma da Previdência - música para os ouvidos de investidores estrangeiros, mas sem caráter popular. Observadores externos monitoram, além do ministro da Economia, o ministro das Relações Exteriores antes de voltarem a investir de forma mais pesada no Brasil.

Na semana passada, o Itamaraty publicou um decreto colocando a Europa - que detinha um lugar privilegiado na diplomacia nacional - na mesma vala comum de África e Oriente Médio. Tal ação poderá acabar por minimizar a aproximação que o Brasil poderia ter com a Europa mesmo diante de um Parlamento Europeu mais à direita.

Já em relação aos EUA, por enquanto prevalecem as análises de que o alinhamento ideológico de Bolsonaro com Trump possa ser benigno para o avanço das relações comerciais entre os dois países. A Casa Branca já emitiu sinais de que é favorável à agenda liberal defendida pelo Palácio do Planalto. Nas Américas, portanto, o clima parece estar mais azeitado, o que estimularia o nível de confiança desejado para investimentos.

O ponto-chave para o envio de recursos agora recairia exclusivamente no andamento da reforma da Previdência. "Esse será o sinal crucial de que as finanças do governo buscarão equilíbrio nos próximos anos e que a dinâmica da dívida pública passará a ser sustentável no longo prazo", comentou Alberto Ramos, diretor de pesquisas para a América Latina do banco Goldman Sachs. No geral, investidores estrangeiros têm uma posição de confiança no governo Bolsonaro, mas precisam enxergar medidas palpáveis porque até agora só ouviram promessas - deste e de governos anteriores.

Caberá, assim, a Bolsonaro e sua equipe ter jogo de cintura para que a conquista de apoios de direita não minem outras relações também fundamentais para o Brasil. A China, maior parceiro comercial do País, é um exemplo. Junto com UE e Argentina, comprou 51,6% das exportações brasileiras de 2018, ampliando participação sobre os 47,1% do ano anterior. Já os EUA diminuíram as importações no período de 12,3% para 12%.

Alertas também vêm sendo feitos em relação ao mundo árabe, grande consumidor das carnes brasileiras, depois que o País decidiu seguir à risca as exigências de abate desses compradores por questões religiosas. Eles não estão muito satisfeitos com a guinada do Brasil em relação a Israel e resta agora saber se o pragmatismo ou a ideologia prevalecerá. Assim como o Reino Unido promete fazer no pós-Brexit, o Brasil terá que correr atrás de relações bilaterais cada vez mais próximas. É isso o que se espera em relação aos EUA: ampliação de acordos comerciais e tratados que evitem bitributação. Na Europa, ainda é preciso ver com mais detalhes como essa aproximação se dará, pois o que cada um dos lados vai fazer ainda é bastante desconhecido.

Célia Froufe, correspondente em Londres, e Ricardo Leopoldo, correspondente em Nova York
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