Economia & Mercados
28/04/2022 14:53

Especial: Fed e cautela global turbinam dólar no exterior e levam DXY à máxima em quase 20 anos


Por André Marinho

São Paulo, 28/04/2022 - A postura mais firme do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) no combate à inflação desencadeou um ciclo de valorização global do dólar nas últimas semanas. Nesta manhã, o índice DXY, que mede a moeda americana ante uma cesta de seis rivais fortes, renovou máxima desde o final de 2002, há quase 20 anos, a 103,928 pontos.

Com novas restrições contra a covid-19 na China e a persistência da guerra na Ucrânia, analistas enxergam um cenário propício à busca por segurança, o que deve manter a divisa dos EUA em níveis elevados no exterior. "O equilíbrio de riscos para o dólar permanece inclinado para o lado positivo neste ambiente de risco instável", resumem analistas do ING.

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Desde que o Fed aumentou a taxa básica de juros em 25 pontos-base na reunião de março, sucessivas leituras de inflação não deram sinais de arrefecimento nos EUA e forjaram um consenso por avanço de 50 pontos-base no encontro da semana que vem. A plataforma de monitoramento do CME Group aponta 96,5% de chance de um ajuste dessa dimensão, que levaria a taxa ao intervalo entre 0,75% e 1,00%. Nem mesmo a inesperada contração de 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) americano no primeiro trimestre, divulgado hoje cedo, mudou as perspectivas.

O Wells Fargo prevê que o Fed fará duas elevações de 50 pontos-base em maio e junho e não descarta a possibilidade de uma alta de 0,75 ponto porcentual. A postura coloca o BC dos EUA em ritmo de arrocho bem mais agressivo que pares desenvolvidos, em detrimento de libra, euro e principalmente iene.

No caso do Banco Central Europeu (BCE), o mercado espera aumento de 150 pontos-base nos próximos 12 meses, mas o Wells Fargo considera essa expectativa exagerada. "À medida que os mercados financeiros se ajustam ao menor aperto dos bancos centrais estrangeiros, esperamos que as moedas estrangeiras enfraqueçam", avalia o banco americano.

Ainda mais vulnerável, o iene sucumbe à insistência do Banco do Japão (BoJ) com a política relaxada, descolada do restante do mundo.Hoje, a instituição manteve sua taxa de depósitos em -0,1% ao ano e anunciou que irá comprar bônus do governo japonês (JGBs) de 10 anos a uma taxa de 0,25% em todos os dias úteis.

Autoridades do país expressaram preocupação com o tombbo da divisa japonesa, que cedeu ao menor níel em 20 anos ante o dólar. Contudo, o presidentee do BoJ, Haruhiko Kroda, reiterou o argumento de que o iene fraco é bom para a economia. Com isso, a tendência é de que o movimento continue. "Até que o BoJ mude sua postura ultra-dovish, a divergência na política monetária aponta para fraqueza contínua do iene e uma intervenção provavelmente teria pouco impacto duradouro", avalia o Brown Brothers Harriman (BBH).

Crescimento fraco

Além das disparidades nas respostas monetárias, outro fator que amplia o fluxo em busca da moeda norte-americana é o sentimento de risco fragilizado em meio a incertezas sobre a economia global. A China registrou aumento no número de casos de covid-19 nas últimas semanas e decretou lockdown restrito em algumas cidades, entre elas Xangai. A capital Pequim ainda não enfrenta o mais rigoroso nível de controle, mas o recente avanço da doença no país levantou temores de que as medidas possam ser endurecidas.

Nos mercados chineses, a disseminação ddo vírus penalizou o yuan, que chegou a cede ao nível mínimo em um ano. A onda de vendas foi contida depois que o Bancco do Povo da China (PBoC) anunciou crte na taxa de compulsório em moedas estrangeiras, de 9% a 8%, com efeito a partir de 15 de maio. No entanto, as iniciativas do BC chinês ainda são vistas como insuficientes para contornar os desafios à segunda maior economia do planeta. "A resposta de estímulos ao impacto da covid-19 está ainda aquém do esperado, em relação à escala dos problemas enfrentados pela economia chinesa", destaca a Pantheon Macroeconomics.

Para o restante do mundo, o quadro representa um fator de pressão às já esgarçadas cadeias produtivas e ameaça o crescimento global. Neste mês, o Fundo Moneetário Internacioal (FMI) cortou a previsão para avanço do Produto Interno Bruto (PIB) global em 2022, de 4,4% a 3,6%, e em 2023, de 3,8% a 3,6%. A invasão da Ucrânia pela Rússia e os surtos de covid-19 na China foram citados como os principais motivos para a revisão negativa. "No geral, os riscos para as perspectivas econômicas aumentaram", resumiu o FMI, no relatório de perspectivas.

Segundo a Capital Economics, a desaceleração da atividade global se junta à escalada dos juros dos Treasuries em um contexto de inevitável apreciação da moeda dos EUA. "Acreditamos que a combinação de um Fed agressivo e um sentimento de risco frágil continuará a impulsionar o dólar", avaliam.

A estrategista sênior de câmbio do Rabobank, Jane Foley, explica que o arrefecimento da economia chinesa ocorre em paralelo à resignação no mercado de que o conflito na Ucrânia se estenderá por muitos meses ainda. Embora Pequim tenha sinalizado a adoção estímulos fiscais e monetários para aliviar o impacto, a política de tolerância zero a casos de covid-19 significa que novos surtos podem voltar a deflagrar a implementação de restrições rígidas. "Esse aumento da demanda por segurança decorrente de temores de crescimento pode resultar em um dólar mais forte por mais tempo", especula.

A analista acrescenta que o vigor do movimento recente suscitou debates sobre se o euro caminha para uma condição de paridade em relaçãão ao dólar. Após a Rússia cortar o fornecimentoe gás a Polônia e Bulgária, investidores temem que uma eventual interrupção mais ampla à Europa empurre a região a uma recessão profunda, com potenciais consequências negativas para a divisa comum. Foley não descarta o cenário, mas acredita que a manutenção da oferta à Alemanha e o início da alta de juros pelo BCE podem manter o euro mais valioso que o dólar.

Contato: andre.marinho@estadao.com
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